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Igreja casada, Igreja viúva

“Quando a Igreja abraça o espírito de uma época, quando ela ‘se casa’ com o espírito do tempo, ela fica viúva no século seguinte”.

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Redação (27/06/2025 11:02, Gaudium Press) Há algumas passagens no Novo Testamento que determinam que, embora vivam no mundo, os cristãos não devem agir de acordo com os valores do mundo. Foi o próprio Jesus Cristo quem dirigiu a Deus Pai a súplica registrada no Evangelho de São João: “Dei-lhes a tua palavra, mas o mundo os odeia, porque eles não são do mundo, como também eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas sim que os preserves do mal” (Jo 17, 14-15).

Não ser do mundo não significa ser uma casta à parte, mas, sim, preservar os valores cristãos, agir de acordo com os ensinamentos de Jesus e evangelizar pelo exemplo, pela moral, pela conduta, pela prática da caridade, pelo hábito da oração.

Infelizmente, porém, há muitos católicos que pretendem trazer o mundo para dentro da barca de Pedro, tentando transformar a Doutrina Social da Igreja numa conformação aos desvios e aos erros que grassam pelo mundo.

Civilização Cristã: o que o mundo teve de melhor

Por muito tempo, a Igreja deu a direção, transmitindo os ensinamentos de Cristo, regulando as relações sociais, valorizando o ensino, a justiça, a moral, enfim, sendo a exemplar coluna que regia os valores humanos, das famílias e da sociedade. Falamos da Civilização Cristã, ou seja, o longo período em que a Igreja exerceu grande influência não apenas na religiosidade das pessoas, mas também nos mais diversos aspectos da vida, como a filosofia, a política, a ética, a educação, a arte.

Em cada período histórico, a sociedade viveu suas alegrias e seus males, desenvolveu os seus costumes e transmitiu as suas crenças, contudo a Igreja sempre esteve acima das realizações temporais; não apartada delas, mas, regulando-as, preservando a fé e a moral, embasada nos altos valores de Cristo, dando especial contributo a todas as áreas e exercendo um papel central.

No entanto, muitos interesses regeram a humanidade, e a Civilização Cristã sofreu não poucos reveses ao longo dos séculos. Manteve-se a Igreja na custódia desses altos valores, mas a sociedade passou a sucumbir a reformas e revoluções, afastando-se, aos poucos, das diretrizes oriundas da fé apostólica, presentes desde o início do Cristianismo, e, assim, precipitou sua decadência…

A Igreja nunca estará ultrapassada

A Igreja assistiu a muitas mudanças e degenerações no tecido social, todavia permaneceu fiel ao seu legado, apesar das pressões externas e internas para acatar as mudanças e “modernizar-se”, “atualizar-se”.

Sendo a representação de Deus na Terra, cabe à Igreja manter-se fiel, porque Deus não muda, “Ele permanece o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade” (cf. Hb 13, 8), e não cabe a esta instituição, o Corpo Místico de Cristo, trair esses valores.

Porém, ao contrário do que muitos pensam, a Igreja não é retrógrada, ela acompanha as mudanças, detecta e impulsiona os avanços científicos, contempla o verdadeiro progresso, e continua servindo de parâmetro em todas as épocas.

Alguns, no entanto, por conveniência ou para justificar a própria mudança de comportamento, a simpatia ou a adesão a valores distorcidos, insistem em que a Igreja deve mudar e substituir certos posicionamentos, que consideram “ultrapassados” diante dos conceitos modernos.

Defendem a posição de que a Igreja deve introjetar aquilo que parece correto e definidor dos novos rumos a serem seguidos, havendo até quem afirme que, ou a Igreja se rende às mudanças, ou ficará para trás.

Lamentavelmente, muitas dessas exigências nascem no seio da própria Igreja, defendidas por representantes seus que desejam que a santa religião consolide comportamentos nascidos do pecado e tendentes ao pecado. Em verdade, desejam que a Igreja mude e legitime o mal ao qual já sucumbiram e que não desejam mais combater.

O ensinamento de um ateu

Por ocasião da eleição do Papa Leão XIV, a imprensa tentou colher as impressões de vários setores da sociedade e de pessoas de destaque a respeito do novo Pontífice. Nesse movimento, no dia seguinte ao Conclave, um canal entrevistou o renomado historiador Leandro Karnal, que foi membro da Companhia de Jesus antes de tornar-se ateu.

E foi exatamente dele, ateu convicto, que ouvi uma das coisas mais lúcidas a respeito dessa insistência de que a Igreja deve mudar sua postura e seus valores para “acompanhar a sociedade”.

Para surpresa dos entrevistadores, que mencionaram algumas aberturas do pontificado anterior, perguntando se considerava que Leão XIV continuaria na mesma linha, ele deu uma resposta lúcida e peculiar: “Quando a Igreja abraça o espírito de uma época, quando ela ‘se casa’ com o espírito do tempo, ela fica viúva no século seguinte”.

Com essas palavras ele deixou claro que a Igreja é a Igreja e a sociedade é a sociedade. Ou seja, as novidades passam, a sociedade muda, mas a Igreja permanece. Dando mostras de compreender muito bem o sentido da pergunta que lhe foi feita, mencionou que, “quando a Igreja abraça questões como feminismo, igualdade de gênero, quando isso passa de moda, ela fica viúva”, portanto, desacreditada.

Como estudioso das religiões, o pensador se refere a tentativas feitas, em épocas diversas, para que a Igreja seguisse certas tendências, o que nunca resultou em acerto e acabou gerando cismas, heresias e apostasias.

Bom seria que não fosse necessário um ateu usar dessa lucidez, mas que aqueles que permanecem fiéis abandonassem a hipocrisia e deixassem de desejar uma Igreja que se amolde aos seus (maus) costumes e relaxamentos. Cabe à Igreja reger a moral e não ceder para agradar aos fiéis.

O céu e a terra passarão…

 Em sua obra Pequeno Ofício da Imaculada Conceição comentado, Monsenhor João Clá Dias afirma que “nada sucede, nem pode suceder no tempo que não tenha sido previsto ou predestinado por Deus desde toda a eternidade”, e podemos considerar que uma das principais coisas previstas e predestinadas por Deus é a permanência e a inerrância de sua Igreja. Por isso, mesmo que pretendam e até tentem fazer com que ela se case com o espírito do tempo e com os modismos das épocas, Jesus Cristo a preservará e manterá a fidelidade de sua Esposa que jamais ficará viúva, pois Ele nunca se apartará dela.

E a confiança dos católicos na fidelidade da Igreja deve estar fundamentada nas palavras de Cristo: “O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão” (Mt 24, 35). Mesmo que isso desagrade a muitos, a Igreja prevalecerá até a volta do Cordeiro. Felizes aqueles que, estando dentro dela, em vez de querer mudá-la e adaptá-la ao mundo, aproveitem a oportunidade de serem mudados por ela e adaptados à sua essência, usufruindo do privilégio de “viver no mundo sem ser do mundo”, garantindo, com isso, a salvação da própria alma.

Por Afonso Pessoa

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