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Leão XIV: A Igreja que Virá

O documento que considerou o título de corredentora de Maria “inapropriado” não foi a única notícia que surgiu na semana passada.

Leao XIV A Igreja que Vira

Redação (10/11/2025 11:16, Gaudium Press) Durante a coletiva de imprensa para apresentação da nota doutrinal, realizada na Cúria Jesuíta ao invés da Sala de Imprensa da Santa Sé, como seria mais apropriado para um documento de tamanha importância, o Cardeal Víctor Manuel Fernández anunciou que o documento sobre a monogamia também seria publicado em breve.

O documento sobre a monogamia, assim como o documento sobre os títulos da Virgem Maria, já havia sido amplamente divulgado pelo Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé em janeiro deste ano, pouco antes do início da hospitalização do Papa Francisco e da etapa final de sua vida.

Restava saber se Leão XIV tinha a intenção de publicar esses documentos. Assim, parece que Leão XIV não pretende deixar inacabada ou desperdiçada nenhuma das obras já iniciadas por seu antecessor.

Ele o fez publicando ‘Dilexi Te’, a exortação sobre a pobreza que leva a assinatura de Leão XIV, mas que, na realidade, reflete profundamente a influência do Papa Francisco. Ele o fez ao aceitar um discurso perante movimentos populares, com os quais continuou a se encontrar, que suscitaram várias das preocupações mais caras ao pontífice argentino, juntamente com a ideia de um cristianismo social que contrasta, em certa medida, com a centralidade de Cristo que Leão XIV defendera desde o início de seu pontificado. E o fez ao publicar os “documentos suspensos”, que podem sofrer alguns ajustes, mas que, na realidade, conservam o espírito de seu idealizador, o predecessor de Leão XIV.

De fato, o documento sobre os títulos de Maria parece divergir significativamente da ideia de unidade e reconciliação na Igreja que permeou a eleição de Prevost como Papa e os primeiros passos de Leão XIV. Por sua própria natureza, o documento do Dicastério para a Doutrina da Fé estava fadado a dividir, de alguma forma.

O Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF) não apenas considerou o título de Corredentora “inapropriado”, como também se manteve irredutível quanto ao título de Medianeira de Maria. Pode-se questionar o que acontecerá com as paróquias que levam o nome de Maria Medianeira (incluindo uma em Siracusa — a que tenho em mente está na Sicília, não no norte do estado de Nova York — chamada Maria Medianeira de Todas as Graças, cujo nome é explicitamente desencorajado no documento da DDF).

Em resumo: este documento abre uma nova frente no debate intraeclesial que talvez não precisasse ter sido aberta.

Leão XIII chegou a falar em corredentora, e João Paulo II gostava de chamar a Virgem Maria assim, tanto que o fez sete vezes durante seu pontificado. Bento XVI, porém, que insistia na precisão — afinal, ele era teólogo —, evitou o título, apontando para as potenciais dificuldades de compreensão.

Mas esse é precisamente o ponto. Se um título é difícil de entender, simplesmente qualificá-lo inapropriado, mesmo em um documento de 21 páginas, sem levar em conta sua clareza e fluidez, não basta. O que se faz necessário é um estudo teológico aprofundado, um debate que, em última análise, permita a todos, senão aceitar, ao menos compreender as conclusões a que se chegou. E é precisamente isso que tem faltado.

O documento teve a mesma gestação que o documento sobre a bênção de casais irregulares, que, segundo Fernández, foi submetido ao Dicastério para revisão. Mais tarde, revelou-se que somente se discutiu de forma geral um documento sobre o tema e que a versão final não foi debatida em detalhes durante a feria quarta, a reunião de quarta-feira de todos os funcionários da Congregação, que serve para abordar os assuntos com uma perspectiva interdisciplinar.

Este documento incorpora o mesmo paradoxo que acompanhou o pontificado do Papa Francisco: uma linguagem “sinodal”, mas centralizada na ação. Nesse sentido, não surpreende que o documento tenha sido questionado ainda durante a sua apresentação, inclusive por um leigo. Contudo, se pressupõe que a sinodalidade seja semelhante a um processo democrático, no qual todos podem e devem expressar a sua opinião, e no qual a voz de cada pessoa tem o mesmo peso.

Nesse caso, acabamos com essas distorções, com leigos buscando substituir os órgãos doutrinais e com debates que são validados simplesmente por serem debatidos.

Era necessário este documento?

Provavelmente não, assim como não era desnecessário o documento que abençoava os casais irregulares ​​— quando é que alguém foi impedido de fazer o simples sinal da cruz na testa? — nem a Traditionis Custodes, que restringia severamente a celebração da Missa e de outros ritos litúrgicos segundo o antigo costume. Todos esses são documentos divisivos que não contribuem nem diminuem o debate, mas tendem a truncá-lo através do exercício do poder autoritário.

Em suma, é por isso que eles têm o efeito de afastar as pessoas da fé.

Em sua homilia para a dedicação da Basílica de Latrão, no domingo, 9 de novembro, Leão XIV falou da Igreja como uma obra em construção. Neste ponto, o Papa Leão XIV deve decidir que tipo de Igreja deseja construir. Ainda não está claro se o Papa pretende primeiro incorporar todas as decisões de Francisco e depois prosseguir com seus próprios ajustes ou novas escolhas. Se essa fosse a estratégia, ele ainda estaria lidando com um legado complexo e um pontificado que ainda não começou.

Se espalhou a notícia de que o Papa convocará um consistório extraordinário de cardeais nos dias 7 e 8 de janeiro de 2026. Nenhuma pauta para a reunião foi divulgada. Portanto, parece que o Papa finalizará todo o trabalho do Papa Francisco até o final do Jubileu, em 6 de janeiro.

Se Leão XIV começar a formar sua própria equipe de governo, então poderá ser possível avaliar com precisão o desempenho do pontífice.

No entanto, para que o governo seja eficaz, ele deve ser composto por pessoas comprometidas com o seu sucesso. Ajustes às reformas de Francisco serão necessários, assim como maior clareza na linguagem sobre algumas questões importantes. O documento sobre a monogamia será uma prova decisiva.

Enquanto isso, nos perguntamos o que aconteceu com o documento sobre a escravidão anunciado por Fernández. Esse era o documento com maior risco de controvérsia, ainda que apenas pela perspectiva particular — e muito latino-americana — de Fernández sobre a posição da Igreja em relação à escravidão.

Cada documento, porém, representa um teste para o novo Papa. Ele aceitará passivamente as decisões tomadas? Ou reagirá aos defensores da Revolução Francisco que o cercam desde o primeiro dia de seu pontificado?

Estamos diante de um longo pontificado, que ainda não pode ser decifrado por completo. E, no entanto, essas questões permanecem relevantes hoje.

Artigo publicado por Andrea Gagliarducci em ‘Monday Vatican’, no dia 10 de novembro de 2025.

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