Os dois filhos da parábola de hoje representam a humanidade: uns prometem cumprir a vontade de Deus, mas não o fazem; outros se negam a realizá-la e felizmente mudam de caminho. E por que não ser, eu mesmo, um filho inteiramente fiel, um terceiro filho que não aparece na história?
Redação (27/09/2020 10:32, Gaudium Press) É lida nos lugares mais variados, dos modos mais diversos. Muitas vezes serve de mero ornamento em casas e estabelecimentos públicos. Há quem memorize suas passagens; quem as viva, entretanto, são poucos. Poucos? Sim, pois praticar tudo o que nela se lê exige autêntica santidade de vida. Já descobriu de quem falamos?
Neste XXVI Domingo do Tempo Comum celebramos o “Dia da Bíblia”, este verdadeiro tesouro espiritual, cujo conteúdo – a Revelação oficial da Igreja – oferece e oferecerá até o fim dos tempos orientação segura para os filhos de Deus.
É fácil falar…
Comodista, pragmático e naturalista: eis a figura habitual do ser humano de hoje.
Já era de se esperar que tomasse as Sagradas Escrituras por aspectos fáceis e agradáveis, e considerasse verdades sublimes de forma superficial ou mesmo distorcida.
Tomemos alguns exemplos oferecidos pela Liturgia de hoje para conferir se realmente colocamos a palavra de Deus em prática ou não.
Não há perdão para obstinados no mal e impenitentes
Que seríamos de nós, miseráveis pecadores, se não tivéssemos um Deus de infinita misericórdia, disposto a perdoar qualquer pecado? A primeira leitura de hoje, contudo, nos apresenta uma condição para que sejamos perdoados:
Quando um ímpio se arrepende da maldade que praticou e observa o direito e a justiça, conserva a própria vida. Arrependendo-se de todos os seus pecados, com certeza viverá; não morrerá. (Ez 18, 27-28)
A Bíblia não nos descreve um Deus pouco exigente. Tampouco nos ensina um amor a Ele sentimental e despreocupado – um simulacro de amor.
A Santa Igreja nos ensina que o arrependimento das faltas e o propósito de não mais cometê-las são condições sine qua non para se obter o perdão divino.
Tanto é assim que, em uma Confissão feita sem arrependimento (verdadeira dor e sincera detestação dos pecados cometidos, com firme propósito de nunca mais pecar) não há perdão de pecados – ensina-nos o Catecismo.
No presente Evangelho, Nosso Senhor repreende os fariseus e salienta que os cobradores de impostos e as meretrizes os precedem no Reino dos Céus. E por quê? Pois aqueles se arrependeram e creram no batismo de João; estes, ao contrário, não se arrependeram para crer nele (Cf. Mt 21, 32).
Quando a hipocrisia se disfarça de caridade
Atualmente muito se fala sobre caridade. Muitos confundem, entretanto, a verdadeira Caridade – virtude teologal – com conceitos meramente filantrópicos.
Belo e nobre é o trabalho desenvolvido por tantos homens e instituições em benefício dos mais necessitados. Pois bem, este deve ser impulsionado pelo amor a Deus e não pelo orgulho, como salienta a II Leitura:
Irmãos, se existe alento no amor mútuo, se existe comunhão no espírito, se existe ternura e compaixão, tornai então completa a minha alegria: aspirai à mesma coisa, unidos no mesmo amor. Nada façais por competição ou vanglória. (Fl 2, 1-3)
A Teologia nos ensina que do homem só podem partir dois amores: o amor a Deus levado ao esquecimento de si mesmo; ou amor a si mesmo levado ao esquecimento de Deus. Assim sendo, qualquer ato, por mais belo que seja na aparência, quando realizado por vanglória, constitui pecado e ruma para o esquecimento do Criador.
Longe de deixar de lado o auxílio aos pobres e necessitados, a Santa Igreja nos ensina a fazê-lo da maneira certa.
“Se eu gastasse todos os meus bens para sustento dos pobres, mas não tivesse caridade, isso de nada me serviria” – afirma São Paulo em sua carta aos Coríntios (1Cor 12, 3). Foi também recomendação do próprio Jesus que, ao darmos esmola, uma mão não soubesse o que faz a outra.
Pois realizar obras de misericórdia só para aparentar uma bondade ou para desencargo de consciência, não se praticando a Lei de Deus, é hipocrisia; e quem reduz a Religião Católica à pagã filantropia de nosso século se assemelha ao sepulcro caiado de que fala Jesus no Evangelho: belo por fora, mas por dentro repleto de podridão.
Que filho eu sou?
Na parábola do Evangelho de hoje, vemos atitudes diversas de dois filhos; elas nos servem para verificar nossa própria posição diante do chamamento que Deus nos faz continuamente. Um dos filhos se nega a trabalhar na vinha de seu pai, mas depois muda de ideia e vai; o outro se compromete a fazê-lo, mas não vai. Quem fez a vontade do pai? – indaga o Divino Mestre. “O primeiro”, respondem os fariseus.
Muitos homens de hoje se julgam cumpridores da vontade de Deus, mas não passam de mentirosos: são aqueles que escolhem alguns pontos da Religião – muitas vezes os mais secundários – e cumprem tão somente estes. Outros se iludem, achando que podem viver obstinadamente no pecado para depois se reconciliarem com Deus.
Se ainda negamos a viver para Deus, mudemos de ideia como fez o primeiro filho da parábola. Mas se nos comprometemos desde o início a pôr a palavra de Deus em prática, sejamos como um terceiro filho que não consta na história; aquele que diz sim a seu pai e age em consequência de sua palavra, por amor a Ele.
Ser fiel a Deus no querer, no dizer, no fazer e no ser é característica daquele que abraçou, de fato, o cumprimento da Religião. Aquele que pratica verdadeiramente a Religião nunca se reduz a meras exterioridades; até estas, no entanto, devem ser fiéis reflexos de seu interior.
Que a Santíssima Virgem, “aquela que ouviu a voz de Deus e a pôs em prática”, nos ampare a sermos ardorosos cumpridores da principal exigência que nos é apontada pela liturgia deste XXVI Domingo: a integridade interior.
Por Afonso Costa
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