Santo Odon, abade

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No dia 18 de novembro, a Igreja relembra a figura de um santo francês: Odon. De carismática e pitoresca personagem, suas virtudes irrigaram o reino Franco de insignes obras de caridade e testemunhos de fé.

Redação (17/11/2020 18:18, Gaudium Press) Odon nasceu em 879, na região do Maine, na França. Seu pai, Abbon — homem de fé, de nobre família e conceituado jurista —, não tendo até então nenhum filho, pediu a Jesus Menino, numa noite de Natal, que, pelos méritos de seu nascimento e pela fecundidade de sua virginal Mãe, lhe concedesse a graça de ter um descendente. Sua oração foi atendida, apesar de sua esposa ser já de idade avançada. Certo dia, vendo o filhinho no berço, tomou-o nos braços e o ofereceu a São Martinho de Tours. Mas não contou a ninguém que, na qualidade de pai, havia feito esse voto.

Tão logo o menino atingiu a idade adequada, Abbon o confiou aos cuidados de um sacerdote para dar-lhe instrução e formação cristã. Pouco tempo depois, porém, arrependeu-se do oferecimento feito a São Martinho e, em vez de encaminhar o filho para o serviço da Igreja, entregou-o a Guilherme, Duque da Aquitânia, para este o iniciar na carreira das armas.

No ambiente mundano da corte ducal, Odon esqueceu rapidamente o que tinha aprendido em seus primeiros anos. Não pensava mais senão no jogo, na caça e nos exercícios militares, deixando de lado as orações quotidianas e outros atos de devoção. No entanto, Deus não lhe permitiu sentir gosto nesses divertimentos vãos. Pelo contrário, quanto mais se engolfava neles, mais sentia o seu gosto amargo, uma tristeza e melancolia cuja causa não conseguia descobrir. Ao mesmo tempo, era atemorizado por sonhos que lhe representavam os perigos de uma vida solta e desregrada.

Em meio a essa perturbação interior na qual se encontrava, recorreu à Santíssima Virgem. Numa noite de Natal, pediu-Lhe que tivesse pena dele e o conduzisse pelas vias retas da santidade. Tinha então dezesseis anos. Na manhã seguinte, ele foi acometido por uma dor de cabeça tão forte que mal conseguia manter-se de pé e julgou ter chegado a hora de sua morte. Essa doença durou três anos, até o dia em que seu pai lhe revelou o voto feito quando ele era ainda criança. Odon ratificou pessoalmente aquele oferecimento e logo recobrou a saúde. Retirou-se em seguida para Tours, onde se dedicou ao serviço de Deus na igreja de São Martinho.

Germina a vocação monástica

Começou então para esse jovem de 19 anos uma vida de oração e de estudos. Passava boa parte do tempo em leituras, e Virgílio era um de seus autores preferidos. Certo dia, tendo visto, num sonho, um vaso antigo, muito belo por fora, mas cheio de serpentes, compreendeu que deveria deixar de lado os clássicos pagãos e aplicar-se ao conhecimento da Sagrada Escritura e dos Padres da Igreja.

Nessa nova etapa de sua vida, leu a regra de São Bento e decidiu pô-la em prática, segundo as possibilidades de seu estado, abraçando uma vida de penitência. Como eram numerosas as peregrinações a São Martinho de Tours, muitas personalidades se dirigiam a Odon para lhe pedir conselho. Não havia quem dele se aproximasse sem ser tocado, no fundo do coração, por suas palavras repletas de doçura divina.

Com a leitura dos Padres da Igreja e da regra de São Bento, Odon começou a acalentar o desejo de abraçar a vida monástica. Pôs-se, então, à procura de algum mosteiro em condições de recebê-lo. Tarefa nada fácil naquela conturbada época. Havia sessenta anos que as guerras civis e as devastações dos piratas normandos arruinavam o país, obrigando os monges a abandonar seus monastérios, em busca de lugares seguros.

Discípulo de São Bernon

Tomando conhecimento da existência do mosteiro de Baume, cujo abade era São Bernon, para lá se dirigiu Odon, então com trinta anos de idade. Levou consigo seus preciosos livros, cerca de cem, um verdadeiro tesouro naquela época de barbárie. Por sua ciência, foi-lhe dado o encargo de cuidar da escola do mosteiro.

Os inícios de sua vida monástica não foram pacíficos. Alguns monges de vida pouco exemplar procuravam afastá-lo do reto caminho, ora procurando envolvê-lo em críticas ao abade, ora fazendo-lhe graves recriminações e, até mesmo, insultando-o. Sua arma, nessas contendas, era a paciência, com a qual procurava apaziguar de todas as formas esses seus irmãos.

O abade Bernon não tardou em discernir o grande futuro desse seu jovem discípulo e o convenceu a receber a ordenação sacerdotal. Depois, vendo aproximar-se o fim de sua santa vida, quis que ele fosse seu sucessor no governo do mosteiro de Baume. Porém, os monges lhe recusaram obediência. Bernon confiou-lhe então o cuidado das abadias de Cluny, de Massay e de Bourdieux.

Abade de Cluny

Santo Odon estabeleceu-se em Cluny, como abade, aos 48 anos de idade. A partir desse momento, o mosteiro começou a distinguir-se de todos os outros pela observância da regra de São Bento, a emulação de virtude entre os monges, o estudo da religião e a caridade para com os pobres, aos quais o novo abade dava esmolas em abundância, sem se preocupar com o dia seguinte. Sobretudo no período da Quaresma, ele era especialmente pródigo com os necessitados, chegando a distribuir alimentos a mais de sete mil pobres.

As virtudes de Santo Odon atraíram para Cluny grande número de homens, tanto leigos como clérigos, muitos deles de elevada condição, e até mesmo bispos deixaram suas dioceses para ali viverem como simples monges. Muitos outros mosteiros submeteram-se à autoridade desse grande reformador da vida monástica, dando assim origem à célebre Congregação de Cluny, que tanta influência exerceu na Europa Cristã, nos séculos posteriores. Vinculado diretamente ao Papa e livre de ingerências do poder temporal, Santo Odon foi o primeiro de uma sucessão ininterrupta de abades santos que durante duzentos anos governaram a nova instituição religiosa, difundindo o bom odor de Nosso Senhor Jesus Cristo por todo o Ocidente cristão.

Devido ao grande aumento do número de monges, tornou-se necessário ampliar as instalações de Cluny e edificar uma nova igreja. Concluída a construção, o abade convidou todos os bispos da região e numerosos dignitários locais para a cerimônia de dedicação. No dia da festa, uma surpresa embaraçosa: os víveres existentes no mosteiro não eram suficientes para acolher tanta gente… Ante o espanto de todos, um feroz javali aproximou-se do edifício e deixou-se apanhar sem dificuldade, contribuindo assim com sua saborosa carne para a refeição oferecida aos convidados.

Um ponto particularmente importante da reforma introduzida por Santo Odon era a regra do silêncio nas horas estipuladas. Um pequeno episódio mostra como os monges cluniacenses a cumpriam com inteira exatidão, mesmo quando estavam fora do mosteiro: certa noite, para não falar numa hora em que a regra prescrevia silêncio absoluto, um deles preferiu deixar um ladrão roubar-lhe o cavalo. Praticou um ato de virtude e não sofreu prejuízo, pois, na manhã seguinte, o ladrão foi encontrado imóvel, montado no cavalo, perto do local do roubo. Era o filho de um moleiro do mosteiro. Conduziram-no então a Santo Odon e este, em vez de castigá-lo com a merecida pena de prisão, mandou dar-lhe cinco moedas de prata, em pagamento do “trabalho de guardar o cavalo” durante toda a noite. E deixou o jovem ir em paz.

Por três vezes os Papas chamaram Santo Odon a Roma, para reconciliar dois inimigos mortais, que viviam em guerra constante — Alberico, patrício romano, e Hugo, rei da Itália — e reformar diversos mosteiros, entre os quais o de São Paulo Extramuros.

Numa dessas viagens, certo homem, impressionado pela santidade que reluzia no rosto do santo abade, prostrou-se a seus pés, implorando-lhe para ser admitido como monge. Mas era um ladrão famoso… não podia ser recebido. Ele, porém, insistiu, argumentando que sua salvação eterna corria sério risco e Santo Odon teria de prestar contas da alma dele a Deus. O Santo então o enviou para Cluny. Esse “bom ladrão” converteu-se num dos mais zelosos religiosos da comunidade. E morreu algum tempo depois em odor de santidade.

Santo Odon, além de grande escritor, foi considerado o maior músico do décimo século e influenciou profundamente o canto litúrgico de seu tempo. Neste grande santo, afirmam seus biógrafos, tudo tinha proporções surpreendentes: sua influência, sua virtude, sua energia.

Última peregrinação ao túmulo de São Martinho

Ao chegar ao fim de sua longa vida, Santo Odon havia acolhido sob sua paternal autoridade os principais mosteiros da Itália e do território francês, restaurando em todos eles a observância primitiva da regra de São Bento. Por ocasião de sua terceira estadia em Roma, uma doença grave lhe anunciou a proximidade da morte. Pediu então a São Martinho que lhe obtivesse a graça de visitar ainda uma última vez seu túmulo. Sua oração foi atendida: curou-se e logo se pôs a caminho de Tours, onde chegou a tempo de participar da festa de seu santo patrono. Três dias depois, voltou a cair enfermo e entregou a alma a Deus nos braços de seu discípulo Théotolon, Arcebispo de Tours, a 18 de novembro de 942.

Sua vida cheia de luzes, provas e dificuldades ainda hoje desperta a devoção dos fiéis, e continua servindo de exemplo a todos aqueles que desejam firmemente chegar à perfeição.

Artigo extraído da Revista Arautos, ano 2006, nº 59, p. 22-25. De autoria de José Antonio Dominguez.

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