Seu exemplo de ascetismo conferiu novo ânimo e impulso às ordens religiosas que trilhavam as sendas da tibieza e do relaxamento.
Redação (05/10/2020 18:02, Gaudium Press) São Bruno nasceu na cidade de Colônia, na Alemanha, no ano de 1030.
Conta a história, um fato preservado pela tradição da Ordem dos Cartuxos, que seu fundador, São Bruno, resolveu abandonar o mundo e tornar-se monge ao testemunhar espantoso acontecimento passado com um então célebre personagem da Paris do século XI, Raymond Diocrés, doutor em Teologia, professor e considerado pessoa muito virtuosa. Faleceu ele no ano de 1082. Uma multidão, com destaque para seus alunos, acorrera para velar seu corpo, colocado, conforme o costume da época, num majestoso leito e coberto com um suave véu.
Sob o olhar atento dos presentes, deu-se início ao Ofício de defuntos. Ora, a certa altura, na leitura de uma das lições, é proclamada a pergunta:
“Responde-me: Quão grandes e numerosas são tuas iniquidades?”
Qual não foi o espanto de todos, ao ouvirem uma voz sepulcral, mas clara, saída de baixo do véu mortuário dizendo:
— Por justo juízo de Deus, fui ACUSADO!
Interrompem o Ofício e levantam o véu, e ali estava o morto gelado e enrijecido, sem o menor sinal de vida. Recomeçam o Ofício e novamente, ao chegar-se à pergunta acima mencionada, “responde-me”, espanto muito maior: o corpo, antes rígido, desta vez se levanta à vista de todos e, com voz mais sonora e forte, afirma:
— Por justo juízo de Deus, fui JULGADO.
E, logo a seguir, cai sobre o leito.
Numa atmosfera de terror generalizado, os médicos analisaram o cadáver, atestando cuidadosamente a inexistência do menor sopro de vida, inclusive por estarem rígidas as articulações. Não houve clima psicológico para retornarem às orações oficiais, que foram transferidas para o dia seguinte.
A cidade de Paris ferveu de comentários e discussões sobre o caso: uns defendiam a tese de que aquele homem havia sido condenado, e era assim indigno das bênçãos da Igreja; outros afirmavam que todos nós seremos ACUSADOS, e depois, JULGADOS. O próprio Bispo oficiante foi partidário desta opinião e por isso reiniciou, no dia seguinte, a mesma cerimônia, desta vez ainda mais concorrida, com um público pervadido de extrema apreensão e curiosidade.
Na mesma passagem da quarta leitura de Matinas, o Bispo proclamou: “Responde-me…” Em meio ao grande suspense, o falecido Raymond Diocrés se levantou e, numa voz aterradora, exclamou:
— Por justo juízo de Deus fui CONDENADO!
E tornou a cair imóvel. Não havia dúvida, estava desfeito o enorme equívoco sobre sua imerecida reputação e falsa glória.
Por ordem das autoridades eclesiásticas, o corpo foi despojado de suas insígnias e lançado em vala comum.
O episódio marcou profundamente aqueles anos e foi esta a razão pela qual Bruno e seus primeiros quatro companheiros testemunhas oculares do fato resolveram abandonar o mundo e abraçar a vida religiosa, resultando daí a fundação da Ordem dos Cartuxos.
Vida penitente e contemplativa
Com efeito, São Bruno e seus companheiros encerraram-se na mais rigorosa das reclusões, entregue à meditação das coisas divinas.
Um famoso escritor Guiberto, abade de Nogent daquele tempo, escreveu sobre a maneira de viver dos primeiros cartuxos: “A Igreja foi construída quase no cume da montanha. O claustro é muito cômodo; mas os cartuxos não moram juntos, como os outros monges. As celas são construídas ao redor do claustro e cada religioso ocupa uma delas, na qual trabalha, dorme e toma suas refeições.
Recebem do ecônomo, aos domingos, pão e legumes para a semana. Os legumes são os únicos alimentos que eles cozinham em suas celas; uma fonte lhes fornece água para beber e para outras utilidades, através de canais que desembocam nas celas. Aos domingos e dias santos solenes comem queijo e um pouco de peixe, quando os recebem de pessoas caridosas; pois não compram nada disso.
Não se reúnem às horas ordinárias; se não me engano, assistem à missa aos domingos e dias santos. Raramente falam e, se tem necessidade de dizer alguma coisa, fazem-no por meio de sinais.
O vinho que bebem é tão aguado que não tem o mínimo sabor e mais parece água. Usam o cilício em cima da carne; suas roupas são bastante dignas. Embora sejam pobres, dispõem de uma rica biblioteca”[1].
Com seu modelo de vida solitária, austera e contemplativa, a Ordem dos Cartuxos de São Bruno atrai bênçãos do céu sobre toda a Igreja.
Texto extraído, com adaptações, da revista Arautos do Evangelho n.42 junho 2005.
[1] (ROHBACHER, Vida dos Santos Volume XVII, p. 363)
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