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Cair no conto do vigário

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Os modernos contos do vigário são terríveis e cada vez mais sofisticados.  

Redação (14/02/2022 10:27, Gaudium Press) É lamentável que a palavra vigário, que pode ser usada para designar padre, pároco, prior, arcebispo, clérigo e até mesmo o papa, tenha dado origem ao termo “vigarista”, que significa trapaceiro, velhaco, ladrão, aquele que burla e engana as pessoas. Mas, faz parte dos meandros da língua, fazer o quê?

A origem da palavra remonta a meados do século XIX e surgiu da expressão “cair no conto do vigário”, tanto que alguns dicionários trazem como uma das definições de vigarista “aquele que aplica o conto do vigário”.

Sabe-se que essa expressão nasceu em Portugal e, embora haja uma série de explicações para ela, algumas bem fantasiosas, a mais aceita é a que narra a existência de um grupo de malandros que se dirigiam a cidades desconhecidas e se apresentavam como emissários do vigário.

Diziam que tinham uma grande quantia de dinheiro numa mala que estava bem pesada e que precisariam guardá-la para continuar viajando. Confiavam a sua guarda a algum morador, mas pediam uma quantia em dinheiro como garantia de que a mala estaria em segurança e para terem meios para prosseguir a viagem. Muitos, por ingenuidade ou ganância, caíram em tal engodo.

Isso pode até parecer mofado, coisa de gente antiga, mas, eu não estaria resgatando essa história se não por um motivo bem atual: muitas pessoas, ainda hoje, na era da alta tecnologia, exploração do espaço e acelerado progresso da Inteligência Artificial, continuam caindo no conto do vigário!

O golpista do Tinder

Em minha casa, temos o hábito de assistir a um filme em família nas tardes de domingo e, no último, o entretenimento escolhido foi um documentário “O golpista do Tinder”. Pensei em desistir nos primeiros minutos, mas fui voto vencido e tive que continuar. Para minha surpresa, foi possível tirar uma lição bem instrutiva.

O documentário começa com uma moça, residente em Londres, contando sobre o seu envolvimento com um rapaz que conheceu no aplicativo de relacionamentos Tinder e como se envolveu com ele. O homem ostentava uma vida de luxo, glamour e muito dinheiro. Restaurantes caros, roupas das melhores grifes, viagens de jatinho, hospedagem em hotéis cinco estrelas. De repente, o príncipe encantado, que se apresentava como filho de um milionário israelense do ramo dos diamantes, e estava proporcionando à jovem um estilo de vida digno de um conto de fadas, vê-se envolvido em uma trama de perseguição de dar inveja ao 007. Por motivo de segurança, depois de um ataque brutal ao seu guarda-costas, que fica gravemente ferido, o rapaz tem seus cartões de crédito bloqueados.

Tudo é muito bem construído, ele envia para a namorada fotos e vídeos do segurança ensanguentado, ele mesmo com a roupa suja de sangue, ambos dentro de uma ambulância. Convencida de que o homem dos seus sonhos está sendo vítima de uma quadrilha internacional, e que corre risco de vida, a moça empresta para ele o seu cartão de crédito. Daí a começar a fazer empréstimos bancários para ajudá-lo é um passo.

Enquanto isso, em Oslo, capital da Noruega, uma segunda mulher, que tinha o jovem milionário como grande amigo, começa a receber as mesmas informações e pedidos… Depois, uma terceira, em Amsterdã, na Holanda.

Para encurtar a história, depois de enormes prejuízos, essas moças acabaram se encontrando, envolveram a polícia e alguns jornalistas no assunto e muito mais vítimas começaram a aparecer. Somados, os golpes, que sustentavam aquela falsa vida de ostentação e luxo, foram de mais de 10 milhões de dólares. Ele foi preso, mas acabou sendo punido apenas por delitos cometidos em Israel, seu país de origem, cumpriu uma pena pífia, não foi indiciado pela extorsão a nenhuma dessas mulheres, e continua livre e feliz.

Por que se cai em golpes?

Sobre isso, nem vamos nos alongar, porque o mal é a escória do mundo. Mentes perversas como essa existem muitas e os contos do vigário – ou do executivo dos diamantes – vão continuar existindo, e a impunidade também. O que me espantou foi que, no finalzinho do documentário, a jovem, que chegou perto de cometer suicídio depois de ficar superendividada com o golpe, declarou, com a maior naturalidade do mundo, que permanece no Tinder, porque acredita no amor e continua procurando a sua cara-metade.

Em poucos minutos, passei da indignação à raiva e ao desapontamento. Como pode alguém passar por uma situação como essa, ficar com uma dívida que levará quase o resto da vida para pagar e continuar no mesmo lugar, com o pescoço exposto à guilhotina? Esse caso é um exemplo dos riscos oferecidos por essa modalidade virtual de relacionamento, mas há muitos outros tipos de golpes e uma imensa quantidade de pessoas caindo neles.

Recentemente, acompanhamos as notícias sobre a prisão de alguns envolvidos em pirâmides financeiras e comércio de criptomoedas e vimos depoimentos de muitas vítimas desse esquema, incluindo artistas e personalidades famosas que perderam grandes somas de dinheiro por terem acreditado na promessa de investimentos com juros miraculosos.

É lamentável, mas temos de admitir que o crime é uma moeda de duas faces. Uma coisa é uma pessoa estar andando na rua, parar o carro num farol, sair de uma agência bancária ou mesmo estar dentro de sua casa e ser assaltada. Outra, é alguém pegar o seu dinheiro, as suas economias, e entregar espontaneamente nas mãos de golpistas, dominado pela ganância, que não anda de mãos dadas com o bom senso e a inteligência.

Ora, numa economia em que os juros dos investimentos ficam na casa de 1% ao mês, acreditar num investimento que promete juros de 10, 15% ao mês, mostra que, no fundo, a vítima quer o mesmo que o bandido: ganhar dinheiro fácil.

Cristão: amante da verdade

É muito provável que, na história das malas de dinheiro do conto do vigário, aqueles que se faziam passar por representantes de um prelado deviam abrir de leve a mala e mostrar algumas notas que encimavam muitos quilos de papel picado, talvez até recheados com algumas pedras, para dar mais peso.

E, aqueles que entregavam o seu suado dinheiro para esses velhacos, nem sempre eram pessoas de boa-fé, cristãos caridosos dispostos a custodiar o dinheiro dos donativos da Igreja. Entre eles, certamente, havia outros tantos ladrões que não viam a hora dos “vigaristas” virarem as costas para meterem a mão no dinheiro deixado sob sua guarda.

Pessoas que seguem essa linha de raciocínio geralmente são consideradas radicais e há até quem diga: “Mas, sendo cristão, como pode pensar assim?” Ora, é exatamente por ser cristão que se pensa assim! Porque um cristão verdadeiro precisa ser amante da verdade e expô-la sem medo e sem usar a perigosa capa do respeito humano.

Foi assim que agiu Nosso Senhor diante dos cambistas no Templo. Ele não contemporizou, não passou a mão na cabeça e nem foi sereno, compassivo e misericordioso com ninguém. Teceu um chicote, virou as mesas e, aos brados, expulsou a todos, ardendo de zelo pela casa do Senhor.

Os modernos contos do vigário são terríveis e cada vez mais sofisticados, mas, enquanto houver homens e mulheres sem essa atitude de alma de Nosso Senhor Jesus Cristo, continuará havendo golpistas do Tinder e de tudo quanto é lugar que se possa imaginar.

Todos estamos sujeitos ao assédio do mal, no entanto, todos os que não têm vergonha de obedecer aos mandamentos, que têm Maria por Mãe e a Deus por Pai, podem pecar, mas não cairão nesses tipos de golpes, porque a felicidade que almejam não é deste mundo e porque se esforçam, todos os dias, para serem “simples como a pomba, mas prudentes como a serpente”. O mal não é reconhecido por quem tem vendas nos olhos, luxúria, avareza e egoísmo dentro do coração.

Afonso Pessoa

 

 

 

 

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