Considerando as maravilhas da Idade Média, tais como as catedrais, os castelos, as Cruzadas, perguntamos como estava constituída a sociedade nessa época.
Redação (04/04/2024 09:31, Gaudium Press) Imbuída de espírito hierárquico, a sociedade era composta de três classes: clero, nobreza e povo.
O clero tem a missão de ensinar, governar e santificar as pessoas, visando a salvação de suas almas. Sendo essa a mais sublime das finalidades, era a primeira classe da sociedade. Estavam a cargo da Igreja o ensino bem como as obras de assistência e caridade, que eram desempenhados sem ónus para os cofres públicos e corresponderiam atualmente aos Ministérios da Educação e Saúde Pública.
A nobreza tinha essencialmente um caráter militar e guerreiro. Tocava-lhe a defesa do País contra as agressões externas e a manutenção da ordem política e social. Suas funções eram algum tanto análogas às exercitas pelas Forças Armadas e Polícia civil.
Ao lado dessas duas classes havia a universitária ou dos intelectuais. Um mestre universitário, às vezes membro do povo, após proferir uma aula brilhante era frequentemente carregado numa liteira pelas ruas, recebendo aplausos.[1]
O povo era constituído pelos burgueses, artesãos e camponeses. A atividade agrícola na Idade Média foi muito intensa. A abundância das plantações trouxe consigo a exportação e a permuta de seus frutos com outros artigos. Assim, incrementou-se o comércio exercido pela burguesia.
Mestres, oficiais e aprendizes
Os artesãos reuniam-se em corporações de ofício, conforme as profissões que exerciam, por exemplo, a dos sapateiros, dos açougueiros, dos carpinteiros. Era frequente que os praticantes de cada ofício vivessem agrupados na mesma rua ou bairro, aos quais davam o nome.
As finalidades dessas corporações eram, entre outras: ensinar os ofícios de modo formal e constante; manter sua boa fama, impedindo as fraudes; criar caixas de auxílio para ajudar os trabalhadores doentes ou caídos em desgraça.
Por ordem de São Luís IX, Rei de França, o Prefeito de Paris Étienne Boileau codificou os costumes das corporações numa obra célebre “Livro das profissões”. Numa corporação havia três graus hierárquicos: mestres, oficiais e aprendizes.
A aprendizagem durava de dois a seis anos. O mestre tratava o aprendiz como filho, acolhendo-o em sua casa e fornecendo-lhe comida e roupas.
Tornando-se perito e sendo aprovado num exame, recebia o título de oficial numa cerimônia. Ele agora era membro da corporação, com direito a voto nos assuntos administrativos. Podia trabalhar por sua própria conta, mas sempre submisso ao mestre. Se mudasse para outra cidade, era recebido como irmão pela corporação respectiva que lhe concedia auxílios.
Para ser mestre, o oficial precisava entregar algum dinheiro à caixa comum e ser aprovado num exame que consistia em apresentar, diante de um jurado, alguma obra- prima.
Faziam parte da Câmara Municipal
Nas corporações reinava o espírito católico. “Estavam proibidos os jogos de azar e se castigavam severamente a embriaguez e qualquer imoralidade.”[2]
Incentivadas pela Igreja, as corporações se reuniam em confrarias, cada uma com seu patrono. Por exemplo, a dos perfumistas tinha como padroeira Santa Maria Madalena. Confraria é sinônimo de irmandade; de fato todos seus membros se consideravam irmãos.
No dia de festa do padroeiro ou da fundação daquele grupo – sapateiros, relojoeiros, por exemplo – seus membros “compareciam todos juntos na igreja, com o estandarte da corporação, para rezar. Depois as mulheres eram apresentadas umas às outras, ou moravam perto porque o bairro era de artífices, onde todo mundo era amigo.
“As corporações tinham representação oficial junto ao governo. “Na Câmara Municipal, por exemplo, não se elegiam por sufrágio universal os vereadores, mas os chefes das corporações, que eram eleitos pelos próprios trabalhadores, faziam parte da Câmara.” […]
“Grupos sociais assim formavam uma rede riquíssima de alto a baixo da sociedade, em que o conceito marxista de luta de classes era quase inconcebível.”[3]
A caixa da corporação ajudava os associados que ficavam doentes, os pobres bem como os asilos, hospitais e outras obras de caridade.
Sociedade orgânica
Dr. Plinio Corrêa de Oliveira ensina que na Idade Média havia uma sociedade orgânica profundamente espontânea e ordeira. “A ordem nasce em grande parte da espontaneidade, e é o fruto da graça”. As pessoas que a compõem precisam ser governadas, pois sem governo “não há possibilidade dessa sociedade de bons, de espontaneidades boas, dar resultado”.
O que significa aqui a palavra “orgânica”?
“A ordem do organismo saudável é precisamente essa. Nele cada célula e cada órgão constituído por essas células são saudáveis, nascendo daí uma interação e uma operação externa também saudáveis, sem que ninguém tenha organizado. Foi a própria natureza posta por Deus que determinou e originou essa organização. […]
“Na sociedade orgânica, o governo faz o papel da alma inteligente, e a sociedade desempenha a função do corpo. Temos, então, uma sociedade inteiramente nascida de uma inter-relação, à maneira da existente num organismo”.[4]
Importância da família
“A célula mater do tecido social orgânico é a família. Ela tem, propriamente, a plenitude da organicidade, e é por causa da irradiação do calor, do alento dela que certa organicidade se comunica a todo o resto da sociedade. Aliás, essa organicidade da família e o conjunto do trato de umas pessoas com as outras, de acordo com os Mandamentos da Lei de Deus, ou seja, a caridade recíproca, são os elementos que constituem a organicidade da sociedade.
“Quando um indivíduo vive intensamente a vida de família, ele compreende de um modo profundo e instintivo que, ou transladamos para as outras relações o caráter da vida de família, ou todas as outras relações são falsas.
“E quando se tem um mestre, fica-se propenso a tratá-lo como a um pai; e quando se é mestre, tende-se a transformar o discípulo em filho também. A relação familiar é uma espécie de analogado primário – matriz – de todas as outras relações”.[5]
Analisando os vitrais e esculturas dessa época histórica, “nota-se que os medievais, na vida quotidiana, têm um profundo bem estar. Não nos causam a impressão de pessoas divididas por doutrinas opostas, remorsos, ânsias, torcidas, ou qualquer outra coisa que caracteriza o mundo contemporâneo. São pessoas profundamente calmas, tranquilas”.[6] O oposto da sociedade orgânica é a sociedade socialista.
Por Paulo Francisco Martos
Noções de História da Igreja
[1] Cf. CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Uma era de fé, heroísmo e sabedoria. In Dr. Plinio. São Paulo. Ano IV, n. 35 (fevereiro 2001), p. 20-23.
[2] VILLOSLADA, Ricardo Garcia. Historia de la Iglesia Católica – Edad Média. 3. ed. Madri: BAC. 1963, v. II, p. 854.
[3] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Origem do Direito consuetudinário -II. In Dr. Plinio. Ano XVIII, n. 206 (maio 2015), p. 14-15.
[4] Idem. Sociedade orgânica. In Dr. Plinio. Ano XVII, n. 193 (abril 2014), p. 20-21.
[5] Idem. O tecido social perfeito. In Dr. Plinio. Ano XVIII, n. 209 (agosto 2015), p.19-21.
[6] Idem. O quotidiano medieval. In Dr. Plinio. Ano XIII, n. 153 (dezembro 2010), p. 21.
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