O bem-aventurado Francisco Palau y Quer O.C.D. nasceu no dia 20 de dezembro de 1811 em Aitona, na província espanhola de Lérida, e faleceu 20 de março de 1872 socorrendo as vítimas de uma epidemia em Tarragona.
Fundou em Barcelona a “Escola da Virtude”, modelo de ensino catequético. Em 1860-61 fundou congregações de irmãos e irmãs carmelitanas terceiras, que deram origem posteriormente às congregações de Carmelitas Missionárias Teresianas e às Carmelitas Missionárias.
Pregou missões populares e difundiu a devoção a Nossa Senhora. Foi beatificado em 24 de abril de 1988. Sua festa litúrgica se celebra em 7 de novembro.
O Beato Palau professou solenemente seus votos na Ordem Carmelitana em 15 de novembro de 1833, tempo de perseguição religiosa. Em 25 de julho de 1835 as turbas republicanas, socialistas e comunistas incendiaram os conventos e as casas religiosas, inclusive o convento do Beato.
Ele teve que partir para o exílio e usou o resto de sua vida o hábito carmelita por baixo de uma batina de padre secular.
Escolheu para morar uma gruta a dois quilômetros de Aitona, hoje conhecida como Cueva del Padre Palau e transformada em santuário mariano.
Mas a perseguição chegou até ali. Ele sofreu atentados de morte e teve de partir para o exílio na França, onde residiu por onze anos até 1851. Na França, a sua fama de santidade se espalhou entre o povo e a nobreza, pelo que também foi perseguido pelo anticristianismo.
Gruta de Aitona, onde foi ermitão, hoje é local de romaria |
Voltou à Espanha em 13 de abril de 1851. Nomeado diretor espiritual do seminário diocesano de Barcelona, ele organizou a “Escola da Virtude” na paróquia de Santo Agostinho.
O extraordinário sucesso da Escola em tirar o povo da influência revolucionária anticristã motivou arruaças socialistas e comunistas.
O governo liberal desterrou então o Beato Palau para a ilha de Ibiza, onde ele permaneceu durante seis anos e fundou uma ermida consagrada a Nossa Senhora das Virtudes, primeiro santuário mariano da ilha.
É autor de vários livros. No fim de sua vida dirigiu e foi o principal redator do semanário “El Ermitaño”, onde publicou suas reflexões sobre o presente e o futuro da Igreja. Seus escritos se destacam pelas suas luzes proféticas.
Nos anos finais de sua vida o Beato Palau trabalhou muito como exorcista. Até concebeu o projeto de uma Ordem de exorcistas e enviou ao Concilio Vaticano I um amplo escrito sobre o tema.
Muitas das formulações mais caras ao Beato encontram-se incluídas no exorcismo para uso público e privado aprovado por S.S. Leão XIII.
Em seu jornal “El Ermitaño”, o Beato Palau tratou especialmente dos eventos de sua época.
Ele via os problemas religiosos, políticos, sociais, econômicos – e até tecnológicos – como fazendo parte de um só e imenso movimento que, animado por Lúcifer e seus sequazes, procurava derrubar a Igreja Católica e a ordem social cristã.
Arguto e intenso analista das informações que chegavam a Barcelona através dos jornais e telégrafos, ele teceu visualizações inspiradas pela Fé e pelos seus estudos teológicos às quais é difícil recusar uma inspiração profética.
Sua linguagem, como era usual em seu tempo, utiliza muitas figuras e símbolos.
Por exemplo, no artigo seguinte, intitulado “Um cometa”, publicado em 25 de Agosto de 1870. O cometa simboliza aqui a libertação de Satanás para fazer o dano ao mundo previsto no Apocalipse:
Exilado a Ibiza, ia ao rochedo Vedrà o fazer retiro espiritual |
“Eu vi um cometa, o mesmo cometa, aquele sinal misterioso, sobre o qual fiz tantas reflexões. Sua cauda tinha forma de espada, de uma espada de fogo que lançava bolas de fogo em direção à terra. Eu fiquei atento olhando para a espada. Horrivelmente fiquei tomado de espanto, porque apareceu uma mão misteriosa que empunhou a espada, e na hora pelo orbe inteiro se ouviram hinos de guerra: guerra no mundo oficial político, guerra entre os reis, guerra por razões de interesse puramente material.
“Enquanto eu olhava a mão que empunhava a espada de aço voltada contra a cabeça dos reis, saiu do cometa outra cauda, e apareceu na hora uma outra mão que pegou a cauda do cometa que era toda de fogo e em forma de espada, e entre trovões e relâmpagos a espada jogava raios e faíscas contra o globo terrestre, e as duas espadas, batendo entre elas, acendiam sobre a terra a mais encarniçada guerra que os séculos já viram: na política e na religião: uma guerra universal. (…)
“O cometa era um sinal colocado no firmamento do mundo espiritual. Ele joga uma luz que ilumina a história presente e vindoura deste mundo material visível onde acontece a atividade humana. (…)
“A luz desse cometa ilustra o cumprimento desta profecia: ‘Satanás será solto da prisão. Sairá dela para seduzir as nações dos quatro cantos da terra’ (Apoc. cap. XX, 7-8).
“À luz deste cometa se vê a obra de Satanás, aquele mistério de iniquidade que começou a se tramar contra a Igreja, quando Ela estava ainda em seus primórdios. Satanás desencadeado seduziu todos os reis e todos os príncipes da terra; ele voltou suas espadas e cetros contra a Igreja: esta é a sua obra.
“O cometa mostra duas mãos e as duas empunham uma espada, e as duas vão contra Cristo e sua Igreja, e anunciam uma guerra igual à dos primeiros séculos, porém mais horrorosa, sem comparação. (…)
“Satanás desencadeado consumou sua maldade, porque obteve nesta ordem material política a apostasia de todos os reis e governos.
“Eu, o Ermitão, percebendo este fato, peguei dois pedaços de madeira, fiz uma Cruz e escrevi nela Quis ut Deus? (…)
“O cometa significa e desvenda o desencadeamento e a libertação do diabo e, em consequência, a apostasia predita pelo apóstolo: um reino de trevas e de maldade, uma época de incredulidade e de erros.
“O cometa descobre anátema, maldição, morte, guerra anarquia social, dias de luto e pranto; e quando o Ermitão vir este sinal, quer dizer, o diabo desencadeado, vos dirá, e vos repetirá sempre a mesma coisa, certo de que o tempo confirmará a verdade destes fatos.”
Lúcifer, autor da revolta no Céu, instiga uma Revolução análoga na Terra
Beato Francisco Palau y Quer O.C.D. (1811-1872) |
As antevisões do Beato Francisco Palau y Quer O.C.D. (1811-1872) impressionam pela penetração e riqueza de panoramas.
As suas previsões referentes aos dias de hoje são surpreendentemente detalhadas, abrangentes, fruto de longos estudos dos autores sagrados, Doutores e grandes teólogos da Igreja.
O Beato via os eventos históricos futuros imediatos se desenvolvendo segundo uma sequência fundamental:
1°. A marcha do mundo em direção à dissolução social e ao estabelecimento de uma anti-ordem caótica como fruto de uma Revolução anticristã;
2°. A denúncia dessa Revolução por um enviado de Deus e seus discípulos, seguida da justa punição divina da iniquidade;
3°. A restauração da Igreja e das nações por obra do Espírito Santo e o advento de um período em que as pessoas imbuídas do espírito do Evangelho dariam uma glória a Deus historicamente inigualável. Esse período histórico duraria até o fim do mundo.
instiga uma Revolução análoga na Terra
O bem-aventurado frade deplorava as sucessivas quebras das instituições fundamentais da ordem cristã como a família e a propriedade.
Lamentava a demolição da moralidade e dos estilos de vida tradicionais, minados pela revolução industrial. Condenava a derrubada das formas tradicionais de governo por constantes golpes políticos.
Não aceitava que todas essas demolições convergentes fossem resultado do acaso. Pelo contrário, a variedade imensa das crises era para ele resultante de uma causa única.
Ele se perguntava se por detrás delas, no comando, não havia alguma inteligência forçosamente diabólica.
Nossa Senhora das Virtudes, grande devoção do Beato Palau |
Sim, respondia ele, o próprio Lúcifer, que seduziu um terço dos anjos no céu, apoderou-se do coração de uma série de homens-chave na Terra e mais uma vez ergueu a bandeira da revolta.
Esse novo Non serviam (“Eu não servirei”) é a grande causa das crises no mundo, concluía. E essa para ele tinha um nome: “Revolução”.
“O que é a Revolução? – explicou – É hoje na Terra aquilo mesmo que aconteceu no Céu quando Deus criou os anjos: Satanás (…) seduziu todos os reis e governos da terra e com a bandeira ao vento dirige seus exércitos na guerra contra Deus, (…) isto é revolução, isto é anarquia entre os homens e guerra contra Deus” (“Triunfo de la Cruz”, El Ermitaño,Nº 125, 30-3-1871.).
“Satanás é o pai da Revolução – ensinava, parafraseando um célebre escrito de Mons. de Ségur –, essa é a obra dele, iniciada no Céu e que vem se perpetuando entre os homens de geração em geração.
“Por primeira vez após seis mil anos ele teve a ousadia de proclamar diante do Céu e da Terra o seu verdadeiro e satânico nome: Revolução!
“A Revolução tem como lema, a exemplo do demônio, a famosa frase: não obedecerei! Satânica em sua essência, ela aspira a derrubar todas as autoridades e seu objetivo derradeiro é a destruição total do reino de Jesus Cristo sobre a terra” (“Adentros del catolicismo – abominaciones predichas por Daniel profeta en el lugar santo: Apostasía”, El Ermitaño, Nº 21, 25-3-1869.).
Segundo o bem-aventurado, essa Revolução realiza os anúncios das Sagradas Escrituras relativos à apostasia dos últimos tempos. A análise racional, tranquila e vigorosa dos acontecimentos sóciopolíticos contemporâneos o confirmava nesta sua convicção.
que o Beato Palau queria evitar
No século XIX a humanidade imergia de modo displicente e veloz na anarquia, impelida pelas tendências desordenadas que alimentam a Revolução, especialmente o orgulho e a sensualidade. Por isso, o Beato Palau concluiu que a dinâmica revolucionaria impulsiona o mundo de modo implacável ao caos e ao desaparecimento da ordem social.
O beato usava como exemplo um acidente ferroviário que abalou seus contemporâneos. Um temporal derribara uma ponte na Catalunha, e um trem expresso – naquela época símbolo embriagador do progresso industrial – sem saber do acontecido, precipitou-se no abismo durante a noite.
Ele viu no acidente uma parábola do mundo superficial e despreocupado, portador de restos de cultura e religião, sendo conduzido pela Revolução rumo a uma catástrofe que o bem-aventurado desejava evitar, mas que ninguém queria ouvir falar:
Guerra Civil Espanhola: um passo na marcha da Revolução
“Uma horrorosa catástrofe anunciada pelos profetas, por Cristo, pelos Apóstolos e por todos os porta-vozes mais autorizados do catolicismo. A sociedade atual, conduzida em massa pelo poder das trevas e pelo poder político, subiu num trem. Mas os maquinistas a levam para os infernos. A estação de onde saiu chama-se Revolução, a próxima estação chama-se Catástrofe Social.
“Agora o trem circula entre uma estação e outra. Os passageiros não pensam, o Ermitão dá berros fortíssimos: ‘Parem, voltem atrás!’.
“Mas essa voz, que é a própria voz do catolicismo, é sufocada pelo ruído do trem. (…) A tempestade levou a ponte. Era noite e o trem que partiu de Gerona ia em frente. Os viajantes não sabiam do perigo, mas a ponte não estava ali. As trevas escondiam o risco, até chegar no abismo. A locomotora deu um pulo e não tinha asas, faltavam os trilhos, só havia o precipício. Ela caiu, arrastando consigo os carros e os passageiros. E as águas os engoliram.
“Eles não acreditaram no perigo, mas ele existia, era verdadeiro, e a incredulidade não os salvou, mas os perdeu.
“Os maquinistas e condutores do trem para onde vai a sociedade atual estão ébrios, perderam o juízo. Não vedes que não acertam uma?
“Descei enquanto puderdes, e jogai-vos nos braços da Igreja vossa Mãe, e assim vos salvareis” (“Catástrofe social”, El Ermitaño, Nº 40, 5-8-1869).
Como a Revolução satânica se infiltrou na Igreja
Conspiração de Claudius Civilis, Rembrandt (1606 – 1669), Nationalmuseum, Estocolmo |
O Bem-aventurado Francisco Palau e Quer O.C.D. tomava como ponto de partida em seus escritos proféticos os fatos políticos, sociais e religiosos que lhe tocava assistir no dia-a-dia. E os analisava conscienciosamente à luz da Fé e dos ensinamentos dos doutores da Igreja.
Ele expunha suas conclusões através de uma linguagem rica em imagens, visando torná-las acessíveis aos leitores de seu jornal “El Ermitaño”.
Assim, ele apresentou uma conversação figurada do personagem principal de sua revista – “o ermitão” – com o próprio Deus, sobre o Concílio Vaticano I, que tantos benefícios trouxe para a Igreja.
Nela, o Beato põe nos lábios de Deus a seguinte explicação:
“Por causa da corrupção dos costumes [Satanás] se introduziu no Sancta Sanctorum e, enquanto comanda todos os reis e poderes políticos da terra em batalha contra Mim desde o exterior da Cidade Santa, paralisa de dentro a minha ação, entorpece minhas empresas e frustra meus projetos” (“Roma vista desde la cima del monte”, El Ermitaño, Nº 58, 9-12-1869).
Entre os instrumentos desta ofensiva interna contra a Igreja ele apontava uns estranhos “sacerdotes” do demônio:
“Alguns destes homens e mulheres exibem uma virtude religiosa aparente, vão se confessar, ouvem a missa, comungam com frequência, mas o que há com eles? Horror!
Sabat das bruxas. Francisco Goya (1746 – 1828),
Museu del Prado, Madri
“Recolhem as formas eucarísticas, levam-nas para casa e as apresentam em sessões satânicas para serem espezinhadas. Esses são os Judas dentro do próprio santuário, que introduziram os demônios no local onde não tem direito, e encheram o templo de Deus de abominações” (“El maleficio”, El Ermitaño, Nº 103, 27-10-1870).
“Satanás entrou no santuário – acrescentava o religioso carmelitano – e o encheu de abominações, sustentado por poderes que se intitulam católicos, e que de dentro do próprio santuário fazem guerra contra nós, uma guerra atroz, a mais perigosa que a Igreja já teve que enfrentar. (…)
“(…) porque ao inimigo convém nos combater a partir de dentro da fortaleza, e por isso ele usa a roupagem e o nome de católico, e com essa fachada se apresenta em certos atos religiosos para fascinar as turbas e criar confusão até no céu” (“Campamento de epidemia en Vallcarca”, El Ermitaño, Nº 99, 29-9-1870).
Em 1968, S.S. Paulo VI afirmou que “a fumaça de Satanás entrou no lugar sagrado” (Discurso ao Pontifício Seminário Lombardo, 7-12-68, Insegnamenti di Paolo VI, Tipografia Poliglotta Vaticana, 1968, vol. VI, p. 1188; e Homilía “Resistite Fortes in fide”, 29-6-1972, ibid., 1972, vol. X, p. 707).
Cem anos antes, o bem-aventurado carmelita já denunciava com horror esta infiltração na Igreja.
Judas negocia a traição de Jesus., Giotto |
Em numerosas ocasiões, o bem-aventurado alude à existência de um “Judas” enquistado na Igreja.
Com esta expressão ele não se referia a um indivíduo em particular, mas a uma espécie de estirpe espiritual que ao longo dos séculos trabalha dentro da Igreja contra Ela.
Segundo ele, essa linhagem do mal se manifestou de modo patente em certos heresiarcas, mas na maior parte do tempo agiu em segredo, escondida da massa do clero e dos fiéis.
No quê consiste essa estirpe? Como entrou na Igreja sacrossanta? Como pôde manter-se n’Ela? Como age? Qual é o seu sinal distintivo?
O santo religioso não se estendeu muito em pormenores históricos. Ele via, porém, que ao longo dos séculos sempre houve manobras diabólicas para infiltrar agentes e organizá-los dentro da Igreja.
O primeiro instrumento foi o próprio Judas Iscariotes, que dá o nome a esta estirpe do mal.
Mas o Iscariotes acabou se autodenunciando quando vendeu o Cordeiro Imaculado ao Sinédrio.
Porém, poucos anos depois, nos tempos apostólicos, este filão da perdição já estava agindo.
É o que diz São João em sua primeira epístola:
“18. Filhinhos, esta é a última hora. Vós ouvistes dizer que o Anticristo vem. Eis que já há muitos anticristos, por isto conhecemos que é a última hora.
“19. Eles saíram dentre nós, mas não eram dos nossos. Se tivessem sido dos nossos, ficariam certamente conosco. Mas isto se dá para que se conheça que nem todos são dos nossos.” (I Jn, II, 18-19)
O Apostolo amado acrescenta que “o espírito do Anticristo de cuja vinda tendes ouvido, já está agora no mundo”. (I Jn, IV, 3)
Simão o Mago subia aos céus e São Pedro (de joelhos) o fez se espatifar no chão na presença do imperador Nero (no trono). São João faz o sinal da cruz. Bennozo Gozzoli |
Os Atos dos Apóstolos (cfr. Act, VIII, 9-24) narram a história de Simão o Mago, que Santo Irineu qualifica de pai de todas as heresias (“Adversus Hereses”, livro I, cap. 23).
O bem-aventurado carmelita atribui a gestação dos erros e desordens na Igreja a esta estirpe de Judas:
“Judas e o diabo se combinaram contra Cristo, mas os dois foram expulsos do colégio apostólico. (…) o diabo buscou então portas para entrar no seio do catolicismo, e as encontrou nos heresiarcas. As portas lhe foram abertas pelos próprios cristãos que lhe entregaram as chaves da incredulidade e da corrupção das doutrinas.
“Agora ele está dentro. Desejais vê-lo? Entrai, e o que vereis?
“Vereis homens que se intitulam católicos, mas blasfemam como demônios e perseguem com furor o catolicismo. (…)
“Vereis o diabo dentro do próprio santuário, desafiando a onipotência de Deus com blasfêmias proferidas diante de seus altares.
“Vereis no povo católico as abominações prenunciadas por Daniel profeta. Vereis o anticristianismo instalado no poder.
“Vereis que o diabo se introduziu no lugar sagrado, e corrompe, perverte, tenta, prova” (“El suicidio”, El Ermitaño, Nº 87, 7-7-1870).
O Beato punha na boca de um demônio as seguintes palavras, falando desta linhagem de heréticos:
Martinho Lutero, máscara mortuória
“Nossa obra que com tanta cautela urdimos desde Judas traidor até esta data, encobrindo o plano com que foi concebida e que com sumo prazer vemos consumada na apostasia de todas as nações” (“Un misterio de iniquidad”, El Ermitaño, Nº 111, 22-12-1870).
Esse plano – segundo a profética previsão do frade carmelitano – iria atingir sua plenitude por uma misteriosa permissão divina:
“Ermitão, (…) escuta: deixa que o diabo e o ímpio completem o mistério de iniquidade que ele iniciou dentro do próprio santuário com Judas traidor” (“Adentros del catolicismo”, El Ermitaño, Nº 21, 25-3-1869).
Contra essa pérfida linhagem lutaram os grandes santos da Igreja, sem nunca terem conseguido extirpá-la completamente.
São Pio X, na célebre encíclica Pascendi Dominici Gregis, de 8 de setembro de 1907, condenou com luxo de detalhes a conspiração dos heréticos modernistas, antecessores diretos dos atuais progressistas.
A descrição feita pelo Santo Pontífice da conjuração modernista concorda admiravelmente com a ideia que o Beato Palau havia formado dessa sibilina estirpe de Iscariotes:
“Os fautores do erro – ensina São Pio X – já não devem ser procurados entre os inimigos declarados; mas, o que é muito para sentir e recear, se ocultam no próprio seio da Igreja, tornando-se destarte tanto mais nocivos quanto menos percebidos.
São Pio X denunciou a conspiração modernista,
mas não teve tempo para extinguí-la
“Aludimos, Veneráveis Irmãos, a muitos membros do laicato católico e também, coisa ainda mais para lastimar, a não poucos do clero que, fingindo amor à Igreja e sem nenhum sólido conhecimento de filosofia e teologia, mas, embebidos antes das teorias envenenadas dos inimigos da Igreja, blasonam, postergando todo o comedimento, de reformadores da mesma Igreja; e cerrando ousadamente fileiras se atiram sobre tudo o que há de mais santo na obra de Cristo, sem pouparem sequer a mesma pessoa do divino Redentor que, com audácia sacrílega, rebaixam à craveira de um puro e simples homem. (…)
“Não se afastará, portanto, da verdade quem os tiver como os mais perigosos inimigos da Igreja. Estes, em verdade, como dissemos, não já fora, mas dentro da Igreja, tramam seus perniciosos conselhos; e por isto, é por assim dizer nas próprias veias e entranhas dela que se acha o perigo, tanto mais ruinoso quanto mais intimamente eles a conhecem. Além de que, não sobre as ramagens e os brotos, mas sobre as mesmas raízes que são a Fé e suas fibras mais vitais, é que meneiam eles o machado. (…)
“(…) continuam a derramar o vírus por toda a árvore, de sorte que coisa alguma poupam da verdade católica, nenhuma verdade há que não intentem contaminar (…) com tal dissimulação que arrastam sem dificuldade ao erro qualquer incauto; e sendo ousados como os que mais o são, não há consequências de que se amedrontem e que não aceitem com obstinação e sem escrúpulos (…)
“Acrescente-se-lhes ainda, coisa aptíssima para enganar o ânimo alheio, uma operosidade incansável, uma assídua e vigorosa aplicação a todo o ramo de estudos e, o mais das vezes, a fama de uma vida austera.
“Finalmente, e é isto o que faz desvanecer toda esperança de cura, pelas suas mesmas doutrinas são formadas numa escola de desprezo a toda autoridade e a todo freio; e, confiados em uma consciência falsa, persuadem-se de que é amor de verdade o que não passa de soberba e obstinação” (São Pio X, Encíclica Pascendi Dominici Gregis).
Ver a Revolução para entender o que está acontecendo
Beato Francisco Palau y Quer O.C.D. (1811-1872) |
O bem-aventurado Francisco Palau y Quer O.C.D.nasceu no dia 20 de dezembro de 1811 em Aitona, na província espanhola de Lérida, e faleceu em 20 de março de 1872 socorrendo as vítimas de uma epidemia em Tarragona, Espanha.
Fundou em Barcelona a “Escola da Virtude”, modelo de ensino catequético, e em 1860-61 as congregações de irmãos e irmãs carmelitanas terceiras, que deram origem às congregações de Carmelitas Missionárias Teresianas e às Carmelitas Missionárias.
Pregou missões populares e difundiu a devoção a Nossa Senhora. Foi beatificado em 24 de abril de 1988. Sua festa litúrgica se celebra em 7 de novembro.
O Beato Palau professou seus votos na Ordem do Carmo em 15 de novembro de 1833, tempo de perseguição religiosa.
Em 25 de julho de 1835 as turbas republicanas, socialistas e comunistas incendiaram os conventos e as casas religiosas, inclusive o convento do Beato. Ele se exilou numa gruta conhecida como Cueva del Padre Palau que hoje é santuário mariano objeto de romarias.
Mas tendo ali sofrido atentados de morte, ele partiu para o exílio na França, onde residiu por onze anos, até 1851, e sua fama de santidade atraiu a perseguição do laicismo anticristão.
Voltou à Espanha em 13 de abril de 1851. Nomeado diretor espiritual do seminário diocesano de Barcelona, ele organizou a “Escola da Virtude” nos bairros operários.
O extraordinário sucesso da Escola para tirar o povo da influência revolucionária anticristã motivou arruaças socialistas e comunistas.
O governo liberal desterrou então o Beato Palau para a ilha de Ibiza, onde residiu durante seis anos e fundou um eremitério consagrado a Nossa Senhora das Virtudes, primeiro santuário mariano da ilha.
Autor de vários livros, no fim de sua vida criou e foi o principal redator do semanário “El Ermitaño”, onde publicou suas reflexões sobre o presente e o futuro da Igreja.
Seus escritos se destacam pelas luzes proféticas. Sua linguagem utiliza muitas figuras e símbolos.
Também no fim de vida o Beato fez muitos exorcismos. Até concebeu o projeto de uma mobilização em massa do clero para exorcizar os demônios que possuem o mundo. Enviou ao Concilio Vaticano I uma raciocinada petição sobre o tema.
Em “El Ermitaño” o Beato Palau tratou dos eventos de sua época, do futuro e do fim do mundo.
Ele via os problemas religiosos, políticos, sociais, econômicos – e até os tecnológicos – como fazendo parte de um só e imenso movimento que, animado por Lúcifer e seus sequazes, procurava derrubar a Igreja Católica e a ordem social cristã.
Arguto e intenso analista das informações que chegavam a Barcelona através de jornais e telégrafos, ele teceu panoramas inspirados pela Fé e pela teologia nos quais é difícil recusar a inspiração profética.
O bem-aventurado Palau julgava que o conhecimento da Revolução, de sua existência, suas metas, seus métodos e agentes, é a chave para decifrar o aparentemente tão caótico acontecer moderno.
Ele dizia que se não se considerasse a realidade à luz dela, perder-se-ia a noção do que se está dando em torno de nós.
Mas seus contemporâneos mal viam a Revolução. Esta tinha cegado suas vítimas, estava se apossando dos poderes temporais e espirituais e imprimia o rumo dos fatos na terra. Explicava ele:
“o miserável mortal não vê (…) que há uma combinação para o mal, (…) sustentada e defendida por todos os poderosos da terra, animados, dirigidos e ordenados sob as ordens de um só príncipe, que é o diabo.
“Não vê esse anjo revolucionário que, executando um plano coerente que vai percorrendo os séculos, conseguiu fazer-se coroar com a glória e o poder de todos os reis do mundo civilizado” (“El reino de Satán sobre la tierra”, El Ermitaño, Nº 32, 10-6-1869).
O bem-aventurado deplorava que as boas iniciativas sofressem frustrações uma após outra. A causa disso radicava em que os seguidores das causas justas não atinavam para a unidade e a universalidade da Revolução:
“O que é a revolução da Espanha? – Um chifre, uma coroa sobre uma das sete cabeças do dragão infernal, essa cabeça se tornou visível nos atos de demolição e destruição de toda a ordem social; (…)
“essa cabeça vai formando um mesmo corpo de delito com as demais nações, formando em todas elas uma maldade única, um exército único, um só dragão, uma coisa só, e essa unidade e sustentada pelo príncipe tenebroso” (id. ibid).
“Se a revolução da Espanha é olhada segundo os cálculos da política, seu triunfo não tem explicação. Se julgamos com as leis da prudência humana aquilo que noticia a imprensa, tudo aparece tenebroso, incerto e movediço.
“Porém, se consideramos que a Revolução está combinada desde séculos passados com a da Itália, com a da França, com a dos protestantes, (…) nossos juízos e cálculos serão mais acertados e proveitosos” (“España: la esperanza de los católicos”, El Ermitaño, Nº 10, 7-1-1869).
Queda dos anjos rebeldes, detalhe. Pieter Bruegel “O Velho” (1525/1530 — 1569), Museus Reais de Belas-Artes da Bélgica, Bruxelas. |
Para ele, a Revolução não é apenas uma matéria para belas dissertações em livros e que se usa para coordenar ideias e conectar aparências.
Tampouco é um fenômeno apenas prático surgido do nada ou do jogo dos interesses da política e da economia humanas.
Ela é o resultado de um longo processo histórico que tem profundas raízes teológicas e morais.
É uma tentativa de revanche do príncipe das trevas contra a obra inefável da Redenção da humanidade decaída com o pecado original, a qual nos obtida pelo Filho de Deus no alto do calvário.
Ele explicava que o fruto específico da Redenção foi a conversão de numerosos povos à verdadeira religião de Nosso Senhor Jesus Cristo, no Oriente e no Ocidente.
Porém, vista desde a perspectiva anticristã, a Redenção pratica um “roubo” ao império de Satanás.
Então, ele não podia fazer outra coisa senão “recuperar” seu reino de perdição. Foi quando excogitou a Revolução na Terra.
A Revolução é a fase atual da ofensiva do demônio contra a Igreja e a Cristandade
A Revolução é o assalto de Satanás contra a Igreja e a Cristandade |
Retrospectivamente, o Beato Palau identificava quatro grandes ofensivas históricas sucessivas perpetradas pelo inferno contra a Igreja e a Civilização Cristã, visando erradicar os efeitos abençoados da Redenção.
1. A primeira consistiu no islamismo. Por meio dele, o inimigo da humanidade conseguiu arrebatar da Igreja a Terra Santa e enormes extensões cristianizadas da Ásia e da África.
Essa ofensiva continua, mas como não conseguiu completar sua meta na História por meio dela, o demônio desencadeou uma ofensiva diversa.
2. A segunda grande ofensiva foram os cismas – principalmente o grego –, que desgarraram da Igreja colossais setores da Cristandade outrora pertencentes ao império greco-bizantino com sede em Constantinopla e a totalidade da Rússia.
Salvo gloriosas exceções, o Oriente evangelizado sucumbiu aos assaltos. Porém ainda ficava o Ocidente.
3. Veio então o terceiro grande assalto infernal. A ponta de lança foi o protestantismo, que arrastou na sua revolta a maior parte da Europa do Norte e importantes setores da Europa Central.
Sem embargo, nações católicas como a França, a Itália, a Espanha, a Áustria e outras resistiram.
4. A ofensiva final começou com a Revolução Francesa de 1789, que é um desdobramento do protestantismo na ordem política e social.
Essa Revolução teve como filho o malfadado movimento socialo-comunista, o qual, por sua vez, deverá preparar o caos final que é o ambiente em que se manifestará o Anticristo.
Na batalha das Navas de Tolosa, os reis espanhóis
conseguiram segurar a ofensiva islâmica com sobrenatural vigor militar
“[1º] no século VI – explicou o bem-aventurado – Satanás saiu de seu cárcere em pé de guerra e apresentou batalha contra a Igreja. Fundou o império da Turquia. (…)
[2º] Depois desse combate, Satanás apresentou outro sob forma diversa. (…) Tendo-se adentrado no próprio santuário, promoveu um cisma. (…) então o Oriente se separou da Igreja latina e sobre essas ruínas ergueu seu segundo império ainda mais terrível que o primeiro, quer dizer, o da Rússia.
[3º] Satanás passou despercebido nessas duas primeiras batalhas e preparou um terceiro ataque contra o centro da Europa católica. Lutero foi o escolhido; (…) o protestantismo erigiu no seio da Europa o terceiro império de Satanás (…)
[4º] Triunfante nessas três batalhas, montou o quarto ataque. A Itália, a Espanha, a França: essas três nações tinham se salvado, e a Áustria ainda não havia sucumbido. (…)
“o catolicismo ainda se mantinha firme sobre essas quatro colunas. Satanás organizou todas suas legiões e deu o assalto. E depois da luta mais sangrenta jamais vista, ele venceu.
“Sobre as ruínas da Igreja na França apareceu no fim do século passado [N.T.: século XIX] uma bandeira: e era aquela mesma que ondejou no Céu sobre as cabeças das legiões revolucionárias: Guerra a Deus! Revolução!” (“Una ilusión funesta”, El Ermitaño, Nº 156, 2-11-1871).
As duas primeiras ofensivas – do islamismo e dos cismas – foram desencadeadas separadamente, com pouca ou nenhuma relação ostensiva entre si.
Mas entre a terceira, a quarta e suas derivadas, a conexão é patente, segundo o bem-aventurado. Ele considerava o protestantismo como o verdadeiro pai da Revolução Francesa e esta a verdadeira mãe do comunismo. E via que no futuro – hoje, nos presentes dias – o comunismo geraria o caos universal, preparando a vinda do Anticristo.
Paris incendiada pelos “communards” (adeptos do comunismo) em 1871. |
Ele explicou essa geração progressiva de revoluções comentando o esmagamento da Comuna de Paris – primeira revolução comunista da História – pelas tropas republicanas:
“Desaparecerão de Paris os Vermelhos, mas ela [N.R.: a Revolução] tornar-se-á rainha e senhora dos vencedores, adorada por todos os que na aparência a combatem.
“Por acaso o vermelho [N.R.: o comunismo] e o tricolor [N.R.: o seguidor da Revolução francesa] não são filhos de uma mesma mãe?
“Essa mãe cruel que queima vivos seus filhos não é a Revolução Francesa de 1793, concebida no século XV pelo protestantismo alemão?” (“La Revolución en París”, El Ermitaño, Nº 135, 8-6-1871).
Profanação das igrejas durante a Comuna (1ª revolução comunista) de Paris |
E comentando a aparente derrota da Internacional socialo-comunista na Comuna de Paris, ele sublinhava:
“A Revolução que estourou na França acaba de receber um golpe, à primeira vista mortal.
“Mas não é assim: a Revolução tem cabeça de serpente, que permanece oculta, escondida nos clubes maçónicos, e desde ali ataca toda autoridade visível.
“Como lei fundamental, a Revolução não tem rei nem cabeça, porque seu rei e sua cabeça é o diabo.
“O diabo encarnado no protestantismo alemão, vendo que Napoleão III dava forma de império à Revolução sua filha (…) invadiu a França e com pasmo e admiração do orbe inteiro, num abrir e fechar de olhos pôs a rodar pelo chão estrangeiro essa cabeça [N.T.: de Napoleão III] e agora apresenta sua obra tal como ela é. Isto é, sem cabeça, sem rei, com a forma que ele lhe deu quando nasceu em 1792” (“La causa de la religión: defensa”, El Ermitaño, Nº 126, 6-4-1871).
Na reunião da quase totalidade dos chefes de governo do mundo na Rio+20 (2012) cerimônias esotéricas para atrair “energias escuras” sobre os políticos reunidos |
Na medida em que a Revolução demole os restos da civilização cristã, ela vai afundando o mundo nas águas estancadas e fétidas de um novo paganismo, pior que o da Antiguidade ou dos povos mais decadentes:
“Dominados os reis, as massas do povo indo atrás de seus governos, resulta que neste mundo político material visível voltou a se constituir o paganismo antigo, embora acomodado em sua forma à especialíssima situação da época” (“Relaciones entre los espíritus y el hombre”, El Ermitaño, Nº 117, 2-2-1871).
Essas afirmações podiam parecer ousadas no século XIX, que avançava alegremente deslumbrado pelo progresso das invenções. Mas ainda não se proclamava abertamente o culto de Gaia – a deusa terra dos ecologistas.
Tampouco se generalizavam, como agora, os sombrios cultos pagãos do Oriente – budismo, hinduísmo etc. – nem as práticas e crenças supersticiosas ou fetichistas de tribos africanas ou americanas sob o rótulo de uma Nova Era.
E os arraiais “católicos-progressistas”, missionários comuno-tribalistas ou carismáticos, não andavam em busca de “novas formas” de oração ou energias vindas das profundezas, ou nas tribos mais primitivas da Amazônia!
Para o Pe. Palau, adotar os decadentes cultos pagãos representa uma apostasia radical do doce jugo de Nosso Senhor Jesus Cristo. E o bem-aventurado comparava essa deserção de massa a um novo deicídio executado na pessoa da Igreja:
“As nações (…) disseram oficialmente pela boca de seus representantes: ‘não reinarás’. Disseram isso a Cristo e à sua Igreja, a Cristo e ao Papa, o dizem ao catolicismo e, abusando de seu poder e autoridade, expulsam ignominiosamente de seu seio, isto é, do mundo oficial, a Esposa do Cordeiro Imaculado. (…)
“Não é isto um matricídio? Sim. É um matricídio cem vezes mais feio e abominável que o deicídio cometido pelos judeus” (“Adviento de 1871”, El Ermitaño, Nº 161, 7-12-1871).
Dom Cristian Contreras, bispo de Melipilla (Chile), ajoelhado diante do altar com os sacrifícios oferecidos por um bruxo andino à Pachamama, 17 de janeiro 2015 |
Por tudo isso, o Beato Palau estava convencido de que no combate apostólico contra a Revolução se jogam os frutos da Redenção.
Renunciar à luta contra a Revolução ou se omitir equivale a se render ao mundo, ao demônio e à carne, a abandonar a Igreja num lance decisivo:
“Pois não é possível transigir nem concordar, salvo para nos prepararmos uns e outros para um golpe decisivo. Entre estes dois extremos não há meio termo: ou a Revolução acaba com o catolicismo, ou este devora a Revolução” (“Cuento de mi sombra”, El Ermitaño, Nº 28, 13-5-1869).
Desde um prisma meramente material, a Revolução parece obra de minorias ativas, capazes de remover com astúcia e vigor que excedem as forças naturais, os obstáculos que encontra em seu caminho.
Se assim fosse – perguntava o Pe. Palau – como explicar que minorias revolucionárias possam impressionar e mudar o destino de nações inteiras?
Como interpretar a espécie de fatalidade e as estranhas coincidências e casualidades que sistematicamente, nos momentos decisivos, se voltam contra as boas iniciativas e favorecem as piores?
O efeito não pode ser maior que a causa e a fatalidade não existe.
Logo, concluía, devem existir potências impalpáveis muito superiores ao homem que influenciam decisivamente as vitórias da Revolução.
Sem elas, os agentes revolucionários não perpetrariam seu labor demolidor com a velocidade e a sincronização com que o fazem:
“Há entre nós, – explicava – residindo no próprio ar que respiramos, um vastíssimo império, cujos príncipes reconhecem um rei, e é um rei absoluto. (…)
“são espíritos puramente tais, inteligências que subsistem como o homem, mas independentemente da matéria, superiores ao homem em força física e espiritual, considerando o homem enquanto ser puramente natural. Excedem ao homem em ciência, inteligência, malícia e astúcia. (…)
“o homem que vive na terra, desde que apostata de Deus e da Igreja Católica, forma com esses seres espirituais família, povo, nação, império, transformando-se em súdito de seu poder.
“Esses homens, apóstatas de Deus, soldados de Satanás, em união com os demônios, constituem na terra o reino visível da maldade que chamamos mundo. (…)
“os príncipes e potestades superiores regem a partir dos ares os reis da terra que se renderam a eles pela apostasia, e os conduzem a uma anarquia completa, a uma dissolução social universal, e à guerra contra Cristo e sua Igreja” (“El reino de las tinieblas”, El Ermitaño, Nº 122, 9-3-1870).
Do ponto de vista natural, não faz sentido que as obras revolucionárias se mantenham em pé, desafiando as leis da natureza, observava o P. Palau.
A anarquia deveria produzir desabamentos irreparáveis na Babel revolucionária. Porém, esta sobe, sempre mais caoticamente, escarnecendo toda lógica e razão:
Estátua de Satanás concebida para ser montada em local aberto
diante da prefeitura de Oklahoma City nos EUA
“Esses poderes políticos – perguntava – que impuseram aos povos um jugo tão pesado, (…) quem lhes dá esse poder?
“Que força os sustenta, não um, mas muitos anos, escravizando, destruindo, desorganizando, dissolvendo até a ordem da natureza?
“Como podem prevalecer na Espanha 200 mil homens em pugna contínua contra 18 milhões?
“Como a massa de povos não se levanta qual mar enfurecido e afunda essa frágil piroga onde navegam uns quantos homens tidos em abominação e execração pela multidão?
“Explicai-me este enigma. Sem a fé católica é impossível! (…)
“Esses homens famosos, (…) que vemos à testa da Revolução na Espanha, na Itália e na França, formam um só corpo moral, um só exército, um só e mesmo império com aqueles anjos rebeldes que no Céu empíreo fundaram a Revolução.
“A única diferença é que essas inteligências, por serem superiores ao homem que venceram, são as potestades e os poderes verdadeiros que dirigem essa guerra.
“E o homem alucinado pela sedução é um instrumento que serve para a execução de projetos combinados muitos séculos atrás por esses espíritos de maldade” (“La causa de Don Carlos”, El Ermitaño, Nº 78, 5-5-1870).
O bem-aventurado esclarecia que nem todo e qualquer sequaz da Revolução entra em contato explícito e formal com demônios que se apresentam enquanto tais.
Pelo contrário, um importante número de revolucionários se horrorizaria, e talvez abandonaria a Revolução, caso lhes fosse proposto semelhante relacionamento.
Por isso o bem-aventurado afirmava que os espíritos das trevas se comunicam diretamente apenas com um número restrito de líderes da Revolução.
Esses geralmente não aparecem dirigindo a política, mas submetidos a essas inteligências tenebrosas e respaldados por seu influxo ativo, comandam a Revolução com maligna precisão.
Para o bem-aventurado, essa categoria seleta e oculta constitui uma espécie de sacerdócio da Revolução. E age como uma caricatura monstruosa e antagônica do único sacerdócio verdadeiro, instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo:
“A festa das bruxas”, detalhe. Francisco de Goya y Lucientes (1746-1828)
Museu de Lázaro Galdiano, Madri, Espanha.
“Assim como o Verbo encarnado tem seus sacerdotes e um pontífice para se relacionar oficialmente e se comunicar por seus órgãos aos povos e nações, [assim também] os demônios, nossos adversários, têm estabelecido (…) uma espécie de sacerdócio para entrar por meio dele em relação oficial com a sociedade humana” (“Programa del Ermitaño”, El Ermitaño, Nº 33, 17-6-1869).
Para a Revolução, esta categoria de súditos tem importância análoga à dos magos do paganismo.
“Destruída a idolatria – escreveu o beato – e levantada publicamente a religião católica das ruínas, os demônios conceberam outro plano de ataque contra a Igreja.
“Não lhes convinha apresentar seu sacerdócio de público e oficialmente, porque não seria tolerado pelo poder da Igreja. Foi assim que começou a fundação do maçonismo. (…)
“Conveio aos desígnios de Satanás esconder o seu sacerdócio; não tendo ele cor oficial, assumia e assume formas várias e esconde o seu operar nas trevas da noite, lá dentro das cavernas da terra.
“Então as pessoas não acreditam que existem e não os conhecem, e seu agir está a coberto do braço da lei e da autoridade.
“Existem falsos sacerdotes, falsos doutores e escritores, existem agora mais do que nunca maléficos magos que dispõem de exércitos invisíveis que matam, envenenam, corrompem, seduzem e pervertem” (“El maleficio”, El Ermitaño, Nº 103, 27-10-1870).
O Beato Palau sofreu atroz perseguição das forças das trevas, angélicas e humanas. Teve larga experiência pastoral com as possessões |
O bem-aventurado Palau considerava que assim como os verdadeiros sacerdotes de Nosso Senhor Jesus Cristo distribuem os Sacramentos, esses ministros da Revolução recorrem às artes mágicas numa escala inimaginável.
Suas manobras políticas ou sociais embutem bruxedos que funcionam como anti-“sacramentos” revolucionários, portadores de uma influência de Satanás.
O Ritual Romano (Rituale Romanum, Titulus XI, caput I, De exorcizandis obsessis a daemonio, n. 20, Desclée et socii, Romae-Tornaci-Parisiis, 1926, p. 446) adverte que nos casos de malefícios, possessões e práticas mágicas, o mago ou a feiticeira manda entregar à vítima algum fetiche ou objeto embruxado.
A esse objeto está unida tal o qual influência diabólica. Certos chefes revolucionários que estão em contato com os demônios recorrem a práticas análogas.
Mas eles não se servem de feitiços vulgares. Em lugar disso, a influência diabólica está ligada a leis ou normas anticristãs ou antinaturais.
Isso não é de espantar. Por exemplo, em nossos dias, Lucien Greaves, porta-voz do grupo Satanic Temple dos EUA, reivindicou o “casamento” homossexual como um “sacramento” da religião diabólica, segundo informou o site LifeSiteNews.
Assim explicava o bem-aventurado Palau:
“Se o malfeitor é um homem da política, (…) eis o malefício político. Consiste ele em danificar não o indivíduo ou a família, mas diretamente uma nação inteira.
“Como? Por meio de leis ímpias, bárbaras, que despojam a nação de tudo quanto há nela de santo e sagrado. Desses centros procedem os decretos emitidos contra os prelados, contra as Ordens religiosas, contra a religião. (…)
“o malefício político tem o apoio do poder dos demônios de hierarquia superior. (…) o malefício político é o mais terrível porque pega em massa uma ou mais nações, o mundo inteiro” (“El dogma católico con referencia a la redención de la sociedad actual”, El Ermitaño, Nº 170, 8-2-1872).
Nas camadas mais subterrâneas do “sacerdócio” revolucionário, a entrega da alma ao demônio é voluntaria:
“Nesta associação abominável o segredo de tudo quanto se pratica é imposto sob pena de morte, sendo os demônios encarregados de castigar o perjuro. O sigilo raras vezes é rompido.
“Esses homens e essas mulheres são uma espécie de energúmenos, mas voluntários, e porque já em vida fizeram entrega de sua alma, corpo, pessoa e bens ao diabo, é raro o caso de que algum deles possa se converter a Deus” (“Relaciones entre los espíritus e el hombre”, El Ermitaño, Nº 119, 16-2-1871).
O P. Palau identificava o centro desse sacerdócio na atividade de sociedades secretas.
O Beato Pio IX alertou muitas vezes sobre as conspirações secretas contra a Igreja |
Excede os limites do presente trabalho entrar em questão tão vasta . Remetemos os interessados às obras de Mons. Henri Delassus, especialmente: “La conjuration antichrétienne – Le Temple Maçonnique voulant s’élever sur les ruines de l’Église Catholique”, Société Saint-Augustin – Desclée De Brouwer et Cie, Lille, 1910, 3 vol.
O Papa Leão XIII, de feliz memória, resumiu o ensino dos Papas sobre a maçonaria nos seguintes termos:
“’Dois amores formaram duas cidades: o amor de si mesmo, atingindo até o desprezo de Deus, uma cidade terrena; e o amor de Deus, atingindo até o desprezo de si mesmo, uma cidade celestial’ [Santo Agostinho].
“Em cada período do tempo uma tem estado em conflito com a outra, com uma variedade e multiplicidade de armas e de batalhas, embora nem sempre com igual ardor e assalto.
“Nesta época, entretanto, os partisans (guerrilheiros) do mal parecem estar se reunindo, e estar combatendo com veemência unida, liderados ou auxiliados por aquela sociedade fortemente organizada e difundida chamada os Maçons.
“Não mais fazendo qualquer segredo de seus propósitos, eles estão agora abruptamente levantando-se contra o próprio Deus.
“Eles estão planejando a destruição da santa Igreja publicamente e abertamente, e isso com o propósito estabelecido de despojar completamente as nações da Cristandade, se isso fosse possível, das bênçãos obtidas para nós através de Jesus Cristo nosso Salvador. (…)
“Os Pontífices Romanos nossos predecessores, em sua incessante vigilância pela segurança do povo Cristão, foram rápidos em detectar a presença e o propósito desse inimigo capital tão logo ele saltou para a luz ao invés de esconder-se como uma tenebrosa conspiração; e, além disso, eles aproveitaram e tomaram providências, pois a eles isso competia, e não permitiram a si mesmos serem tomados pelos estratagemas e armadilhas armadas para enganá-los.
“A primeira advertência do perigo foi dada por Clemente XII no ano de 1738, e sua constituição foi confirmada e renovada por Bento XIV.
“Pio VII seguiu o mesmo caminho; e Leão XII, por sua constituição apostólica, Quo Graviora, juntou os atos e decretos dos Pontífices anteriores sobre o assunto, e os ratificou e confirmou para sempre. No mesmo sentido pronunciou-se Pio VIII, Gregório XVI, e, muitas vezes, Pio IX.
“Tão logo a constituição e o espírito da seita maçônica foram claramente descobertos por manifestos sinais de suas ações, pela investigação de suas causas, pela publicação de suas leis, e de seus ritos e comentários, com a frequente adição do testemunho pessoal daqueles que estiveram no segredo, esta sé apostólica denunciou a seita dos Maçons, e publicamente declarou sua constituição, como contrária à lei e ao direito, perniciosa tanto à Cristandade como ao Estado; e proibiu qualquer um de entrar na sociedade, sob as penas que a Igreja costuma infligir sobre as pessoas excepcionalmente culpadas.
“Os sectários, indignados por isto, pensando em eludir ou diminuir a força destes decretos, parcialmente por desprezo, e parcialmente por calúnia, acusaram os soberanos Pontífices que os passaram ou de exceder os limites da moderação em seus decretos ou de decretar o que não era justo.”
(Leão XIII, Encíclica Humanum Genus, 20 de abril de 1884, apud Acción Católica Española, Colección de Encíclicas e documentos pontificios, 4ª ed., Publicaciones da Junta Técnica Nacional, Madrid, 1955, LXI+1644+351 págs., págs 36 e ss. No site do Vaticano).
“Nos antros tenebrosos das lojas, os franco-maçons constituem com os demônios uma família e uma sociedade, comunicando-se com eles sob mil formas e meios.
“O diabo-rei está com o Grande Oriente à testa da franco-maçonaria como Cristo com Pio IX à frente de toda a Igreja: Pio IX é a cabeça visível da Igreja, e Cristo é a cabeça invisível.
“O Grande Oriente é a cabeça visível do império do mal, e o diabo-rei é sua cabeça invisível. Não há soberano na terra que não esteja iniciado nos segredos da franco-maçonaria” (“Milagros del espiritismo”, El Ermitaño, Nº 138, 29-6-1871).
Também de modo mais difuso, porém mais perceptível ao homem comum, dito “sacerdócio” se exerce através das práticas supersticiosas e mágicas que procuram entrar em contato com espíritos do além.
Estas últimas apresentavam no século XIX formas que hoje se metamorfoseiam. E também incluem a camaleônica proliferação de satanismo, com rótulos genéricos como New Age e suspeitas “medicinas alternativas”.
“O espiritismo – dizia o bem-aventurado – é o sacerdócio do paganismo moderno, e seus apóstolos fazem coisas deveras prodigiosas. Entre outras, têm o poder de curar, não pela graça, mas um poder comunicado por Belzebu, príncipe de todos os demônios” (id. ibid.).
Monumento público ao Anjo Caído, Madri, Espanha |
O Beato Palau identificava três níveis de demônios em função de seu contato com os homens.
Em geral, os que se apossam dos corpos humanos pertencem a categorias menos relevantes.
Os demônios de um grau superior tomam conta de figuras revolucionárias de destaque como, por exemplo, Lutero, Robespierre ou Lenine.
Por fim, a terceira e pior categoria está em conúbio com os máximos dirigentes da Revolução, que habitualmente agem despercebidos do comum dos homens e inclusive de muitos revolucionários.
“Eu vejo – explicava – todas as forças inimigas divididas em três grandes corpos de exército: cada um dele dispõe de milhões de combatentes.
“Um deles está alojado nos corpos humanos, (…)
“Outro corpo de exército ocupa (…) as altas regiões da política.Destronados todos os Reis católicos, seus tronos estão ocupados por homens possuídos pelo diabo (…)
“Há outro exército, que é o que dirige os dois primeiros. Seu quartel-general está montado numa sociedade de homens que se intitulam espíritas, ou com o nome de magos e maléficos. (…)
“Os demônios (…) dirigem desses clubes maçônicos todas suas forças engajadas na batalha contra Cristo e sua Igreja” (“Crónica del teatro de la guerra”, El Ermitaño, Nº 85, 23-6-1870).
A experiência pastoral, especialmente a prática de exorcista, permitia ao B. Palau denunciar com documentos e exemplos concretos essa colusão de homens e demônios.
Em numerosos artigos de “El Ermitaño” estão descritos exorcismos praticados pelo Beato Palau com confissões dos demônios possuidores, e/ou a transcrição de pactos com Satanás.
A consideração do recurso revolucionário aos demônios em nada desanimava o bem-aventurado que, acreditava firmemente que os anjos da luz combatem do lado do bem.
Tais anjos, além de seus incalculáveis poderes naturais, são portadores da graça divina.
E acima deles o Beato Palau venerava a Santíssima Virgem, Rainha dos Anjos e general supremo, que ordena as milícias celestes a iniciarem os movimentos para o esmagamento da Revolução, de seus chefes e sequazes.
Se os fiéis se voltarem para Ela e para as coortes celestes invocando o seu socorro, terão aliados invencíveis.
As mencionadas associações mais ou menos secretas estavam amplamente disseminadas e articuladas na sociedade civil, a partir da qual se introduziram na esfera eclesiástica.
Detalhe do Juízo Final. Stefan Lochner (1410-1451), Wallraf-Richartz-Museum, Colônia |
Num diálogo figurativo a respeito do Concilio Vaticano I, o Beato Palau põe nos lábios de Deus a seguinte explicação:
“Pela corrupção dos costumes [Satanás] entrou no Sancta Sanctorum, e enquanto dirige todos os reis e poderes políticos da terra em batalha contra mim lá no lado de fora da cidade santa, de dentro de meu próprio alcácer paralisa minha ação, entorpece minhas empresas e frustra meus projetos” (“Roma vista desde la cima del monte”, El Ermitaño, Nº 58, 9-12-1869).
Referindo-se aos aludidos “sacerdotes” do demônio, escreveu:
“alguns desses homens e mulheres apresentam uma virtude religiosa aparente, confessam, ouvem missa, comungam frequentemente.
“Mas, o que digo? Horror! Recolhem as hóstias, levam-nas para casa e as apresentam em suas satânicas funções para pisoteá-las.
“Esses são os Judas dentro do próprio santuário, que introduziram os demônios no lugar que não lhes corresponde, e enchem o templo de Deus de abominações” (“El malefício”, El Ermitaño, Nº 103, 27-10-1870).
“Satanás entrou no santuário – acrescentava –, e o encheu de abominações, sustentado por poderes que se dizem católicos, e de dentro do próprio santuário faz a guerra contra nós, uma guerra atroz, a más perigosa que a Igreja jamais teve de travar. (…)
“porque convêm ao inimigo nos combater de dentro da própria fortaleza, por isso leva o uniforme de católico, e o nome, e com o nome apresenta certas realizações religiosas, para fascinar as turbas e levar a confusão até o Céu” (“Campamento de epidemia en Vallcarca”, El Ermitaño, Nº 99, 29-9-1870).
Em 1968, S.S. Paulo VI afirmou que “a fumaça de Satanás entrou no lugar sagrado” (Discurso para o Pontifício Seminário Lombardo, 7-12-68, Insegnamenti di Paolo VI, Tipografia Poliglotta Vaticana, 1968, vol. VI, p. 1188; e Homilia “Resistite Fortes in fide”,29-6-1972, ibid., 1972, vol. X, p. 707).
Cem anos antes, o Beato Palau já denunciava com horror essa penetração na Igreja.
Triunfo da morte, detalhe. Prefigura da marcha enlouquecida da Revolução. Pieter Bruegel (1525-1530 — 1569) Museo del Prado, Madri. |
O Beato Palau via a Revolução avançando como um bólido descontrolado, impedido de se deter:
“o império do mal pegou velocidade, e corre com tanta maior rapidez quanto maior é o crime que pesa sobre ele, tendo-lhe ficado impossível se deter.
“Na sua corrida, quebra, esmaga, destrói, esfrangalha, vence todos os obstáculos que lhe opomos para fazer que retroceda.
“Progresso! Para frente! Progresso! Bradam seus condutores” (“Faraón y el Anticristo”, El Ermitaño, Nº 77, 28-4-1870).
O B. Palau não tinha ilusões. Se o mundo encharcado de orgulho e sensualidade não se convertesse, a catástrofe prefigurada pelo desastre do trem de Gerona tornar-se-ia espantosa realidade.
Quando sucederia isso?
Ele não estabelecia datas, mas antecipava sinais certeiros. Entre eles, a reação dos homens quando o desastre fosse iminente:
“Na medida em que a sociedade humana se aproximar do cataclismo, sentirá convulsões, comoções horríveis, terá um pressentimento seguro, que lhe anunciará a desgraça.
“Dirá em voz baixa, surda, mas forte: Estamos indo mal! (…) Atrás! Alto! Parem o trem!
“Clamará aos condutores da sociedade inteira, com voz rouca e de trovoada: Alto!!! Estou perdida! Deitai-vos, maquinistas, pisai no freno! Ai de mim! Perco-me!
“e os motoristas contestarão em tom arrogante: Não! Maldita, tu vens conosco aos infernos: nós te formamos à imagem dos vícios que te merecem este castigo (…)
“o fogo voraz de tua concupiscência é o que produz na máquina o vapor de tuas doutrinas ímpias, obscenas, impuras, blasfemas, e esse vapor, que tu mesma respiras, essa respiração imunda é o motor que fornece impulso a todo o trem aonde tendes subido. Desce, raça maldita, comigo ao abismo!” (“¡Horrorosa Catástrofe!”, El Ermitaño, Nº 40, 5-8-1869).
Procissão na Universidade de Harvard, EUA, pedindo o cancelamento de “Missa Satânica” no local de estudos. O ato luciferino foi suspenso. |
À medida que a humanidade – argumentava o B. Palau – for submersa no caos, sentirá calafrios e poderá resistir ao passo final.
Quando o caos parecer total, a Revolução terá atingido um auge. Porém, ao mesmo tempo, o horror que ela provocará vai gerar condições máximas para a sua ruína.
Prevendo este dilema mortal, a inteligência propulsora da Revolução teria preparado uma cilada: suscitar um pseudo salvador ou pseudo profeta.
Este surgiria como que “miraculosamente”, oferecendo-se como única opção para evitar o caos. Em troca de uma miragem de ordem, pediria a rendição das vontades a seu influxo pessoal.
As redes de comunicação irradiariam ao mundo os desiderata do pseudo salvador. Ele manipularia perspectivas enganosas de paz e prosperidade e sugeriria poderosamente aos últimos fiéis cessarem a resistência à Revolução, convidando-os a adorar seu ídolo.
Na prática, semelhante poder estaquearia o reinado da Revolução, que ameaçaria desabar.
O imperador Napoleão I, que espalhou as doutrinas e derrubou as monarquias, como tinha desejado sem consegui-lo a Revolução Francesa, foi prefigura de uma manobra do gênero.
Segundo o bem-aventurado, no tempo dele estavam postas quase todas as premissas para que a Revolução alcançasse esse sinistro objetivo: uma ditadura universal e a adoração coletiva do ser mais oposto a Cristo que haverá na História.
Porém, no século do bem-aventurado, o XIX, faltava que o progresso nas comunicações e nos transportes permitisse uma conexão tão instantânea e global que um só ente – seja um homem ou uma organização sem rosto – pudesse comandar o planeta com a ascendência de um supremo guia universal.
A inauguração do túnel de São Gotardo, na Suíça, o maior do mundo, foi feita com um ritual de tipo satânico em 1 de junho de 2016. |
“As ferrovias e os fios elétricos – explicava o P. Palau – aproximaram os povos uns dos outros, (…) de maneira que hoje um só homem pode governar e dirigir toda a sociedade humana com mais facilidade do que outrora um rei reger uma só nação.
“Aproximadas as nações umas às outras, a união jogará entre si todos os programas, tanto em política como em religião.
“E o choque no mundo das ideias e da moral será como o dos trens que chocam vindos de direções opostas e provocam uma explosão horrorosa.
“sendo livres e fáceis a imprensa, a litografia e outros meios de comunicação, criar-se-á uma confusão tal de doutrinas, que podemos afirmar sem temor de sermos desmentidos, que a sociedade humana atingiu a meia-noite no momento que foi descoberto o vapor e a eletricidade.
“A confusão de ideias nas inteligências deu como resultado a revolução em todos os países. Sobre a ruína das monarquias se levantam repúblicas, (…)
“cada nação percebe em seu seio horríveis convulsões, causadas por programas de governo que se destroem mutuamente.
“Um rei não pode confiar na palavra de outro rei, e olhando-se como inimigos uns dos outros, se armam até os dentes, excogitando novas máquinas de morte.
“Para evitar um conflito convocam-se congressos europeus, e neles não se entendem nem se põem de acordo, e saem deles em desacordo, e cada um faz por si próprio preparativos de guerra que arruínam a nação.
“E essa ruína é a miséria do país. O país se insurge em revolução e nesta situação a sociedade humana anda de mal a pior. (…)
“Aqui tendes tudo quanto convinha preceder o estabelecimento de um império universal no orbe.
“O advento ao trono de um imperador que reduza a uma todas as nações do globo, e a um só todos os programas políticos e religiosos que agora nos dividem, será o ponto final de todas estas revoluções que agitam horrivelmente os povos e os chafurdam pelo chão como como serpentes feridas de morte.
O anticristo quererá reinar como rei e ditador universal. Vitral na igreja de Santa Maria, Frankfurt, Alemanha. |
“Um só Deus, um único rei, uma religião só: este é o programa que gravado nas bandeiras imperiais, encherá um dia de espanto o mundo inteiro, e no dia seguinte lhe dará a paz e a prosperidade.
“Esse dia está tão perto, como perto sentimos estar a dissolução social universal em todos os sentidos e em todas as partes do corpo social” (“La cuestión del Oriente: un imperio universal”, El Ermitaño, Nº 11, 14-1-1869).
Por vezes, o B. Palau qualifica como “império” o ilusório e enganador regime final da Revolução.
Visa assim caracterizar seu perfil ditatorial.
Mas outras vezes o define como uma república federal universal, para ressaltar a nota de recusa a toda forma de autoridade e desigualdade legítima.
A coexistência contraditória do absolutismo odioso com o espírito libertário radical é intrínseca à Revolução.
Essa contradição é uma das características da tirania caprichosa e desapiedada de Satanás sobre o caos da eterna noite infernal.
Com uma mão ele persegue os bons e com a outra favorece os maus.
Podem-se ver exemplos nos momentos ápices das revoluções: no anabatismo de Münster, no Terror durante a Revolução Francesa ou nos extermínios em massa do regime stalinista na ex-URSS.
Para o santo e clarividente carmelita, uma confusão imprudente entre as religiões,
favorece o ambiente para o Anticristo instaurar sua ditatorial religião universal.
O império ou república universal planetária, que o bem-aventurado Palau via se formar segundo planos luciferinos anticristãos, deverá ter como consequência e pilar fundamental o afloramento de uma religião universal.
Há hoje um ecumenismo imprudente que parece caminhar para esse fim.
“Oficialmente não haverá outra religião senão a do Estado. Um só Deus, uma só religião. E esse Deus será o Anticristo, e essa religião, a anticristã” (“Incendio de barracas en Barcelona”, El Ermitaño, Nº 170, 8-2-1872), escreveu.
Nela deverão se amalgamar todas as crenças, numa convergência caótica favorecida e até estimulada pelas transformações globalizantes que acontecerão na esfera temporal.
Tudo isso sem muitas preocupações pela verdade ou pelo erro, pelo que é moral ou imoral, no ambiente consagrado pela expressão “ditadura do relativismo”.
Mas, previa o B. Palau, essa confluência não trará a verdadeira paz.
Pelo contrario, disfarçada de conhecimento e compreensão recíproca entre religiões, seitas e filosofias, levará o desentendimento e a discórdia da humanidade ao paroxismo, beirando o desespero:
“Unidos pelo vapor e pela eletricidade num mesmo vagão, ficarão o cristão, o mouro, o judeu, o protestante, o cismático, o missionário, a monja, o frade, a prostituta.
“Postos lado a lado todos os programas religiosos de todas as nações, na religião será inevitável outro choque, mais terrível sem comparação que o político.
“Essa guerra religiosa jogará o pai contra o filho, um vizinho contra outro, um povo contra outro povo e uma nação contra outra.
“Completar-se-á a dissolução social no orbe inteiro a partir do seio da família, e chegará até o trono do rei nos palácios” (id. ibid.).
Em encontro ecumênico, ídolo de Buda sobre o sacrário do altar. Assis, 27 de outubro de 1986. |
O bem-aventurado discerniu o fundo satânico dessa religião universal num convite lançado pelo espiritismo:
“Essa seita acaba de fazer um convite geral a todas as religiões por ordem dos espíritos superiores, para que todas, inclusive o catolicismo, se unam e constituam uma só religião sob a direção dela.
“Podemos chegar mais longe? O que é que é isto? Aonde iremos a parar?” (“Plan del espiritismo”, El Ermitaño, Nº 29, 20-5-1869).
Um século antes da perfuração do túnel debaixo do Canal da Mancha, o bem-aventurado comentou um projeto de unir a Grã-Bretanha ao Continente:
“Pensa-se criar uma ponte gigantesca entre Calais e Douvres, que porá a Inglaterra em comunicação com o continente. Segundo o plano apresentado pelo engenheiro francês M. Boutet, a ponte se apoiará sobre vinte e nove arcos, e se tem completa segurança de colocar os pilares correspondentes, rodeados além do mais de cabos, que em vez de serem um perigo, servirão de abrigo para os buques nas terríveis tempestades do estreito.
“No Istmo de Suez será inaugurado um canal que põe em comunicação as águas do Mediterrâneo com o mar das Índias, em outubro do ano em curso.
“Damos estas noticias porque os fatos a que se referem desenvolvem e explicam as profecias relativas ao império universal, primeiro sobre a terra do Anticristo, e depois de Cristo e de sua Igreja.
“Pela monstruosa ponte teremos a Inglaterra unida às demais nações da Europa, e pelo canal de Suez o presidente da república federal comunicará com as quatro partes do globo” (“Monarquía democrática”, El Ermitaño, Nº 32, 10-6-1869).
Na inauguração do Canal de Suez, o bem-aventurado registrou outro indício premonitório dessa religião universal:
“O canal de Suez já foi aberto para a navegação de todas as nações. No momento de comunicar o Mediterrâneo com os mares da Índia, as águas foram abençoadas simultaneamente por um sacerdote católico, um pope grego, um pastor protestante, um armênio, um ulema e um budista” (“El Istmo de Suez”, El Ermitaño, Nº 58, 9-12-1869).
Um século antes, o B. Palau discernia em gestos como esse – hoje repetitivamente banais – um ecumenismo imprudente, penetrado pelo espírito da Revolução.
O fim último da religião planetária em gestação não era levar todas as almas para a única Igreja verdadeira.
Pelo contrario, gestava-se uma falsa convergência ecumênica que preparava para adorar Satanás como que habitando em alguma figura que se fará conhecer como sumo representante da Revolução.
Como é que conceitos como “ecumenismo” podem ser distorcidos a ponto de transmitir o oposto do que significam? A este respeito veja-se a obra do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira Baldeação ideológica inadvertida e diálogo, Editora Vera Cruz, 5ª ed. 1974.
“A palavra “ecumenismo” – explica o Prof. Corrêa de Oliveira – tem, de si, um sentido excelente.
“No entanto, ela é susceptível também de um significado irênico. Admitidas todas as religiões como “verdades” relativas, postas entre si num diálogo hegeliano, o ecumenismo toma o aspecto de uma marcha dialética de todas elas para uma religião única e universal, integrada sinteticamente pelos fragmentos de verdade presentes em cada uma, e despojada das escórias das contradições atualmente existentes.
“Visto assim, o ecumenismo é uma imensa preparação de todas as religiões, feita através do diálogo hegeliano, para, uma vez unificadas, entrarem em ulterior diálogo com a antítese comunista.” (op. cit., p. 101).
Para o clarividente Beato Palau, a república federal universal que estava sendo preparada consistiria num estado de coisas edificado em desafiante abstração do Criador.
Contemplando a imensa – mas periclitante – Babel revolucionária, fruto de suas mãos, os homens seriam tomados de uma autossatisfação raiando na adoração.
Essa república universal sem fronteiras e sem autoridades respeitáveis seria a realização mais ousada do “Não servirei!” de Lúcifer, entoado por vozes humanas.
Surgiria um mundo que se levanta caprichosamente segundo leis dadas pelos homens a si próprios, desconhecendo a autoridade do Legislador Supremo.
Assim sendo, o bem-aventurado estava certo de que os tempos do Anticristo profetizados no Apocalipse estavam se tornando realidade já na sua época, mas que haveria de atingir sua plenitude proximamente:
“Aquilo que São João viu em visão profética [N.R.: Apocalipse] nós o olhamos com os nossos próprios olhos. Satanás, diz no capítulo XX, será desencadeado, sairá de seu cárcere e seduzirá as nações que vivem nas quatro partes do mundo Essa corrupção, sedução e apostasia é já um fato consumado” (“Antonia”, El Ermitaño, Nº 81, 26-5-1870).
Comentando essa epístola, o Beato Palau escreveu:“No que se refere à vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo (…) antes deve vir a apostasia e deve se manifestar o homem da iniquidade, o filho da perdição, que se opõe e se insurge contra tudo o que se chama Deus ou é adorado, até se sentar no templo de Deus e se proclamar Deus a si próprio” (II Tes, II, 1-12).
Na encíclica E supremi apostolatus, de 4 de outubro de 1903, São Pio X ensina:
“Quem pesa estas coisas tem direito de temer que uma tal perversão dos espíritos seja o começo dos males anunciados para o fim dos tempos, e como que a sua tomada de contato com a terra, e que verdadeiramente o filho de perdição de que fala o Apóstolo (2 Tess 2,3) já tenha feito o seu advento entre nós, tamanha é a audácia e tamanha a sanha com que por toda parte se lança o ataque à religião, com que se investe contra os dogmas da fé, com que se tende obstinadamente a aniquilar toda a relação do homem com a Divindade!
“Em compensação, e é este, no dizer do mesmo Apóstolo, o caráter próprio do Anticristo, com uma temeridade sem nome o homem usurpou o lugar do Criador, elevando-se acima de tudo o que traz o nome de Deus.
“E isso a tal ponto que, impotente para extinguir completamente em si a noção de Deus, ele sacode entretanto o jugo da sua majestade, e dedica a si mesmo o mundo visível à guisa de templo, onde pretende receber as adorações dos seus semelhantes.
“Senta-se no templo de Deus, onde se mostra como se fosse o próprio Deus (2 Tess 2,2)”.
(San Pio X, Encíclica E supremi apostolatus, in Escritos Doctrinales, Ediciones Palabra, Madrid, 4ª ed., 1975, 557 págs., pp. 19-21).
Para os espíritos superficiais, desinteressados face à existência e aos objetivos da Revolução, a instalação desse poder de atração universal terá algo de repentino.
Para dar uma ideia de um fato tão surpreendente, o B. Palau apelava para os exemplos das fulgurantes campanhas militares de Napoleão I e de Guilherme de Prússia.
O mundo ainda não conhecia as conquistas desconcertantes de que a guerra psicológica revolucionária é capaz, nem os bruscos surgimentos de líderes políticos e mudanças da opinião pública operadas pelos meios de comunicação social:
“O Anticristo vai nos pegar de surpresa – dizia.
“Hoje somos aquilo que somos, mas amanhã na hora de acordar ser-nos-á anunciado que um gênio guerreiro desfez as potências mais fortes do globo, e que tendo nós perdido a nacionalidade, estamos sob o seu domínio.
“No dia seguinte um decreto imperial anunciará a supressão do culto católico em todo o universo.
“Em outro dia serão publicadas as penas em que incorrem aqueles que não se rendam às leis do imperador” (“Roma”, El Ermitaño, Nº 12, 21-1-1869).
O Anticristo recebe as instruções de Lúcifer. Luca Signorelli (1445 – 1523), basílica de Orvieto, Itália |
Em todas as coisas, especialmente nas considerações sobre eventos futuros, o Beato Palau amava as verdades solidamente ancoradas nas anfractuosidades da vida concreta, as verdades vistas de frente, por mais duras ou complicadas que fossem, e as hipóteses cuidadosamente analisadas.
Ele sabia objetar contra seus próprios raciocínios e fazia seu o melhor dos contra-argumentos.
Nada de mais contrário a ele do que as simplificações fáceis ou os panoramas alegremente descolados da realidade ou do razoável.
Por isso mesmo abordava os assuntos mais delicados e complexos, que pedem a mais cautelosa e matizada resposta.
Entre esses temas estava discernir de modo prudente mas preciso o perfil do Anticristo, para o qual a Revolução prepara os caminhos.
Seus escritos refletem a diversidade de opiniões existentes sobre o assunto entre os melhores intérpretes tradicionais das Escrituras.
Para ele, era indubitável que o Anticristo receberá, numa paródia da Encarnação, o poder de Satanás. Mas essa paródia blasfema de Cristo poderia se realizar num indivíduo ou também num grupo:
“O Anticristo é o triunfo do diabo e do pecado em guerra contra Cristo e sua Igreja no terreno da política e da força brutal. É o diabo encarnado e tornado visível no poder comunicado a homens” (“El Anticristo”, El Ermitaño, Nº 16, 18-2-1869).
Não espanta, pois, que em muitas ocasiões ele chame de Anticristo ao conjunto da Revolução e seus seguidores, considerando-os um só ente moral:
‘El Ermitaño’ foi o jornal do Beato nos últimos anos de vida. Na foto o nº 59 “O Anticristo é o império do mal sobre a terra, protegido, escudado, e auxiliado pelos poderes políticos dos reis. O Anticristo é o dragão encarnado neles, personificado em suas doutrinas e em sua autoridade.
“E o Anticristo se revela e se revelará cada dia mais em signis et portentis mendacibus, entrando em comunicação familiar com todos aqueles que queiram encontrar abrigo sob suas bandeiras” (“El dragón”, El Ermitaño, Nº 46, 16-9-1869).
O B. Palau supunha também que um indivíduo de carne e osso haveria de ser exaltado como expressão suprema da Revolução. A ele se aplicaria por antonomásia o nome de Anticristo.
O demônio é um puro espírito e, enquanto tal, não pode ser percebido fisicamente pelos homens.
Para fazer-se adorar por uma humanidade ateizada e carnal na etapa última da Revolução, ele precisa se manifestar através de algum ser visível e palpável.
O demônio, então, escolheria um ser humano no qual faria transparecer suas energias infernais como sendo “divinas”. Seria uma paródia extrema e blasfema da Encarnação de Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Por causa disso é estigmatizado como Anticristo.
De onde sairia esse demiurgo? Assim responde, falando sobre os revolucionários iniciados nas artes que manipulam energias ocultas:
“Esses homens têm suas escolas normais ou lojas (…) e nelas os demônios se tornam visíveis não enquanto tais, mas sob a aparência de anjos de paz, guardiães dos interesses sociais. Dessas lojas sairá treinado o Anticristo. (…)
“Essa sociedade maléfica (…) terá sempre maior incremento, até que apareça sem máscara, visível, à testa do Anticristo” (“El dogma católico con referencia a la redención de la sociedad actual”, El Ermitaño, Nº 170, 8-2-1872).
Terá, pois, íntimas relações com formas de satanismo tipo Nova Era ou certas “medicinas alternativas” mais ou menos empapadas de parapsicologia ou ocultismo.
Procederá da estirpe de Judas enquistada na Igreja? Não encontramos no bem-aventurado nada que permita afirmá-lo ou negá-lo taxativamente.
Numa cova em Aitona, Espanha, o Beato montou sua ermida perseguido pelo ódio anticlerical. |
Inspirado na segunda carta de São Paulo aos Tessalonicenses (II Tes, 1-12), o bem-aventurado apontava que o Anticristo teria talento para enganar com fantasias falazes, cativar com ilusões enganosas e fazer fulgurar sedutoramente a mentira.
Veja o comentário de Santo Tomás de Aquino a essa epístola em: O Anticristo, segundo Santo Tomás de Aquino
Por isso aparecerá como um mago ou grande ilusionista, que fascinará e/ou deixará perplexas as almas através de influxos comunicados pelo rei da ambiguidade infernal.
Essa faculdade enfeitiçadora voltar-se-á especialmente para aqueles que não caíram nas rédeas da Revolução.
Inclusive suas imposturas prodigiosas poderão ser confundidas com virtude, ou derivadas de poderes como os eclesiásticos podem conferir:
“O Anticristo será o mago mais famoso e célebre que jamais houve” (“Milagros del espiritismo”, El Ermitaño, Nº 138, 29-6-1871), dizia.
“À frente e à cabeça desses magos famosos está para chegar aquele célebre homem, de quem foi profetizado que se apresentará ao mundo in omni operationi Satan, com signos portentosos para seduzir até aqueles que têm seus nomes inscritos no livro da vida, se possível fosse” (“Cosas de mi pueblo”, El Ermitaño, Nº 139, 6-7-1871).
Ser-lhe-á concedido um breve tempo para tentar os últimos fiéis, segundo o bem-aventurado.
Sobre a personalidade do Anticristo, São João Damasceno ensina:
“Não será o diabo encarnado, mas sim um homem filho da fornicação, que será formado no segredo e estabelecerá subitamente seu reino. De início fingirá santidade; mas logo arrancará a máscara e perseguirá a Igreja de Deus”
(São João Damasceno, La fé ortodoxa, IV, 26, Patristiche Texte und Studien, Berlin-New-York, 12, p. 232-234, apud, Écrits sur l’islam – Présentation, commentaires et traduction par Raymond Le Coz, Les éditions du Cerf, París, 1992, 269 págs., p. 90).
Antes desse grande enganador se exibir descaradamente aos últimos homens de fé, o Beato Palau também designava com o rótulo de Anticristo o corpo moral da Revolução que lhe prepara o advento:
“A Revolução é todo o poder político dos governos da terra, e sua cabeça é o Anticristo. Vemos já todo o corpo, isto é, todos os reis da terra ligados por uma única ordem: Guerra a Deus!
“Só falta que apareça a cabeça, e essa vai receber seus poderes vindos do diabo. No Anticristo, o diabo atingirá o poder no mais alto degrau que lhe pode ser consentido sobre a terra” (“Crímenes y atrocidades de la magia maléfica”, El Ermitaño, Nº 33, 17-6-1869).
“Isto é o que temos em vista: vemos o corpo do Anticristo; sua cabeça não aparece ainda, mas sim vemos já formado seu império”, a Revolução (“Fin del mundo: aparición de Elías Tesbites”, El Ermitaño, Nº 120, 23-2-1871).
Olhando para o Anticristo, as revoluções anteriores – Revolução protestante, Revolução Francesa, Revolução bolchevique e Revolução de Maio de 68 – se reconhecerão nele e sentir-se-ão interpretadas e realizadas.
Isso lhe atrairá a confiança das diversas formas de revolucionários, inclusive dos indispostos entre si, que se aglutinarão em torno de sua maléfica figura.
As falsas religiões descobrirão nele traços da divindade que adoram e em volta dele se dará uma convergência ecumênica universal.
Quando se revelará ele aos homens? Virá em nossos dias?
Ou só veremos a manifestação de alguma prefigura?
O bem-aventurado achava que a marcha extremamente avançada da Revolução prepara diretamente sua iminente aparição.
Um ecumenismo imprudente será explorado pelo Anticristo para impor sua religião universal panteísta |
Mas, ao mesmo tempo, estava convencido de que a Misericórdia divina cortaria o passo da iniquidade revolucionária.
Porque Deus, na sua misericórdia – dizia ele –, enviaria alguém revestido da missão de Elias profeta, para converter as nações e lhes conceder um derradeiro período de paz e de ordem.
Quase meio século antes das aparições de Nossa Senhora em Fátima, o bem-aventurado pressentia profeticamente aquilo que Nossa Senhora anunciou aos três pastorzinhos:
depois de grandes castigos corretivos, o mundo se converterá e terá paz. Quer dizer, virá o reino triunfal do Imaculado Coração de Maria.(Cfr. Antonio Augusto Borelli Machado, Fátima – Mensagem de tragédia ou de esperança?, ArtPress, SP, 46ª ed., 1997).
Nesta perspectiva, tudo o que toca ao Anticristo está num suspense. Para tentar decifrá-lo, o Beato Palau voltava sua mente para os mistérios que envolvem o grande profeta do Carmo e sua vinda futura.