A autêntica união entre os homens só pode existir na única Igreja de Cristo, que a fundou para a salvação de todos.
Redação (31/03/2022 16:08, Gaudium Press) Talvez jamais tenha se apoderado como hoje do coração dos homens um desejo tão intenso de fortalecer e aplicar ao bem comum da sociedade humana os vínculos de fraternidade que nos unem, em virtude de nossa comum origem e natureza.
Porque não gozando ainda plenamente as nações dos dons da paz, antes pelo contrário, estourando em diversas regiões discórdias novas e antigas em forma de sedições e lutas civis, e não podendo se dirimir as tão numerosas controvérsias sobre a tranquilidade e prosperidade dos povos sem concurso do esforço e da ação conjunta daqueles que governam os estados e fomentam seus interesses, percebe-se facilmente – muito mais estando todos de acordo na unidade do gênero humano – o motivo de serem tantos os que anelam ver as nações cada vez mais unidas entre si por esta fraternidade universal.
A falsa doutrina do fundamento comum
Algo muito parecido a essa fraternidade universal lutam alguns por obter no relativo à ordenação da Nova Lei promulgada por Cristo nosso Senhor.
Convencidos de que é muito raro encontrar homens privados de todo sentimento religioso, parecem nutrir a esperança de que não será difícil levar os povos, apesar de suas divergências religiosas, a concordarem fraternalmente na profissão de algumas doutrinas consideradas como um fundamento comum da vida espiritual.
Por isso costumam eles organizar reuniões, conferências e congressos, com não pequeno número de assistentes, e convidar a todos indistintamente para os debates: cristãos, infiéis de todo gênero e até mesmo pessoas que, por desgraça, se separaram de Cristo ou negam com obstinada pertinácia a divindade de sua Pessoa ou sua missão.
Tais empreendimentos não podem de modo algum serem aprovados pelos católicos, porque se apoiam na falsa teoria de que todas as religiões são mais ou menos boas e louváveis, pois, embora de forma diferente, todas manifestam e significam o sentimento natural e congênito pelo qual nos voltamos para Deus e reconhecemos respeitosamente seu poder.
Na realidade, erram e se enganam todos quantos sustentam tal opinião; além disso, rejeitam a verdadeira religião, adulterando seu conceito essencial, e descambam para o naturalismo e o ateísmo.
Daí se segue claramente que quem adere a tais opiniões e empreendimentos afasta-se totalmente da religião revelada por Deus. […]
O homem deve crer de modo absoluto na Revelação
Não pode haver verdadeira religião fora daquela que se fundamenta na palavra revelada por Deus. Começando na origem e prosseguindo durante a Antiga Lei, essa revelação foi aperfeiçoada pelo próprio Jesus Cristo, com a Nova Lei.
Agora, se Deus falou – e a História comprova que Ele falou – é evidente que o homem deve crer de modo absoluto na revelação de Deus, bem como prestar-Lhe total obediência. E o Filho Unigênito de Deus fundou na terra sua Igreja para podermos cumprir bem esse duplo dever, tendo em vista a glória de Deus e nossa salvação.
[…] Sem dúvida alguma, essa Igreja fundada de modo tão admirável não poderia acabar nem se extinguir com a morte de seu Fundador e dos Apóstolos, seus primeiros propagadores, pois ela recebera o mandato de conduzir à eterna salvação todos os homens, sem distinção de tempo nem de lugar: “Ide, pois, ensinai a todos os povos” (Mt 28, 19).
No ininterrupto cumprimento desta missão, faltariam acaso à Igreja a força e a eficácia, quando lhe dá perpétua assistência o próprio Cristo que solenemente afirmou: “Eis que Eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”? (Mt 28, 20).
Portanto, a Igreja de Cristo, além de necessariamente existir hoje e sempre, há de ser também exatamente a mesma que foi nos tempos apostólicos; a menos que se queira dizer – e disso estamos bem longe – ou que Nosso Senhor Jesus Cristo não cumpriu seu propósito, ou que Se enganou ao afirmar que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela (cf. Mt 16, 18).
[…] Sendo assim, é óbvio que a Sé Apostólica não pode de forma alguma participar de tais congressos, nem podem os católicos apoiar ou favorecer semelhantes empreendimentos; se fizessem isso, dariam autoridade a uma falsa religião, inteiramente alheia à única e verdadeira Igreja de Cristo.
A verdade revelada não admite transações
Poderemos acaso tolerar – isto seria o cúmulo da iniquidade – que a verdade, sobretudo a verdade revelada, se renda e entre em transações? Pois, no caso presente, trata-se de defender a verdade revelada. Para instruir na Fé evangélica todas as nações, enviou Cristo seus Apóstolos ao mundo inteiro; e para preservá-los de todo erro, quis que antes o Espírito Santo lhes ensinasse toda a verdade (cf. Jo 16, 13).
Por acaso essa doutrina dos Apóstolos se evanesceu por completo ou ao menos se debilitou alguma vez na Igreja assistida, dirigida e custodiada pelo próprio Deus?
Se nosso Redentor declarou expressamente que seu Evangelho se destina, não apenas aos tempos apostólicos, mas também às eras futuras, terá podido tornar-se tão obscura e incerta a doutrina da Fé a ponto de ser hoje preciso tolerar nela até as opiniões contraditórias?
Se isto fosse verdade, dever-se-ia dizer também que o Espírito Santo infundido nos Apóstolos, bem como a perpétua permanência do mesmo Espírito na Igreja e até a própria pregação de Jesus Cristo teriam há muitos séculos perdido toda utilidade e eficácia: afirmação evidentemente blasfematória.
O fundamento da caridade é uma fé íntegra e sincera
Pode parecer que tais “pancristãos”, tão empenhados em unir as igrejas, tenham o nobilíssimo objetivo de fomentar a caridade entre todos os cristãos. Mas, como é possível que a caridade redunde em dano à Fé?
Por certo, ninguém ignora que São João – o Apóstolo da caridade, que parece revelar-nos em seu Evangelho os segredos do Sagrado Coração de Jesus e que não cessava de inculcar no espírito de seus discípulos o novo preceito “amai-vos uns aos outros” – proibia de forma absoluta todo relacionamento com quem não professava a íntegra e pura doutrina de Cristo: “Se alguém vier a vós sem trazer esta doutrina, não o recebais em vossa casa, nem o saudeis” (II Jo 1, 10).
Assim, uma vez que o fundamento da caridade é uma fé íntegra e sincera, os discípulos de Cristo devem estar unidos sobretudo pelo vínculo da unidade da Fé. […]
Compreende-se assim, veneráveis irmãos, o motivo pelo qual esta Sé Apostólica nunca permitiu aos fiéis participar dos congressos de acatólicos. Isto porque só se pode fomentar a união dos cristãos esforçando-se por reconduzir os dissidentes à verdadeira Igreja de Cristo, da qual tiveram eles a desgraça de se afastar; à única e verdadeira Igreja que com certeza todos conhecem, e que, pela vontade de seu Fundador, deve permanecer sempre tal qual foi por Ele fundada para a salvação de todos.
Excertos de: PIO XI. Mortalium animos, 6/1/1928 – Tradução: Arautos do Evangelho
Texto extraído da Revista Arautos do Evangelho, n.231, março 2021
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