Quer na Gruta de Belém, quer durante sua vida familiar, Jesus foi o divino exemplo de quanto devemos nos fazer “como meninos”. Sua inocência cresceu em manifestações ao longo de sua vida até o momento em que, morrendo crucificado, redimiu o gênero humano.
Redação (25/12/2024 19:58, Gaudium Press) A pleno júbilo repicam os sinos à meia-noite. Numa envolvente atmosfera de alegria, paz e harmonia, marcam eles o início da Missa do Galo. No interior do edifício sagrado quase não há sombras, a luz domina o ambiente, em inefável sintonia com o órgão e as melodiosas vozes. Os fiéis sentem-se atraídos a meditar sobre um dos principais mistérios de nossa Fé, a Encarnação do Verbo, o nascimento do Menino Jesus.
Deus quis se fazer conhecer pelos homens
Cada festa litúrgica, ao nos propor a consideração de um determinado aspecto do Salvador, desperta em nós reações às vezes intensas: o Tabor nos causa admiração pelo brilho do acontecimento; acompanhando os Passos da Paixão, as lágrimas banham nossas faces; vibramos de gáudio ao considerar a Ressurreição e a Ascensão. E a doçura radiante emitida pela manjedoura de Belém não só nos encanta, como pervade nossas almas e as envolve em doce suavidade.
Ali está a Bondade em essência, sob a roupagem de nossa débil natureza. Nela realizou-se um dos maiores desígnios da Trindade Santíssima em relação aos habitantes deste vale de lágrimas.
Deus falou-nos durante séculos, através das criaturas e dos profetas, tornando patente seu empenhado desejo de fazer-Se conhecer pelos homens. E, afinal, acabou por nos enviar seu próprio Filho.
“Nestes dias, que são os últimos, Ele nos falou por meio do Filho, a quem Ele constituiu herdeiro de todas as coisas e pelo qual Ele criou o universo” (Hb 1,2).
A partir de então, Ele Se pôs ao alcance de nossa inteligência, pelas obras de Deus humanado. Quem poderia imaginar um meio mais excelente de comunicação entre Criador e criaturas?
“Puer natus est nobis!”
“Nasceu-nos um Menino!”. Haverá maneira mais singela de referirmo-nos a Deus? Abandona Ele os fulgores da divindade e Se apresenta, sobre palhas, na fragilidade de um recém-nascido. Durante séculos e séculos suspiraram os profetas por esse dia, tornado, por fim, realidade:
“Um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, a soberania repousa sobre seus ombros, e Ele se chama: Conselheiro admirável, Deus forte, Pai eterno, Príncipe da Paz. Seu império será grande e a paz sem fim sobre o trono de Davi e em seu reino. Ele o firmará e o manterá pelo direito e pela justiça, desde agora e para sempre” (Is 9,5-6).
Jesus ama a pureza de coração
Se há uma nota que superlativamente nos atrai na criança, esta é, com toda certeza, a candura, que a faz ignorar a maldade. A pureza de coração, com a qual ela cria para si um universo de beleza moral que, se não trilhar as vias da santidade, ela perderá por não lutar contra a concupiscência decorrente do pecado original. Esta é a virtude que Jesus, no berço, nas praças ou no Templo, na Cruz ou na Ressurreição, mais ama (cf. Mc 10,13-16).
Eis a maneira de retribuirmos plenamente ao Menino Jesus todos os benefícios recebidos: mantendo-nos inocentes até o dia do Juízo. Aí sim, faremos sua alegria, na companhia de Maria e José.
Mas, se a alvura de nossas vestes batismais tiver sido tisnada pelo pecado, se foram elas rasgadas pelo desvario de nossas paixões e perderam os perfumes daquela candura de outrora, como proceder?
Acima de tudo, não devemos nos deixar abater. Façamos mergulhar nossa túnica nas miraculosas águas da penitência. Elas a lavarão, reconstituirão e a impregnarão de um celestial aroma. Nossas lágrimas de arrependimento junto ao Menino Jesus, sob a maternal proteção de Maria Santíssima e os rogos de São José, infalivelmente nos obterão a restauração de nossa inocência, conforme Ele mesmo nos prometeu (cf. Jo 14,13; Lc 11,9-10).
A inocência: a verdadeira paz para este mundo
Peçamos a Maria que, nesta feliz e santa noite de Natal, faça nascer o Menino Jesus no presépio de nossos corações, para torná-los tão puros e inocentes quanto o d’Ele.
Conta-se um significativo fato ocorrido na época das caravelas. Debate-se a frágil embarcação sob uma terrível procela. Os tripulantes põem-se todos a rezar no tombadilho, implorando o socorro divino. Vendo bem que nada prognosticava o aquietamento daquelas enfurecidas ondas, rogam um milagre. Eis que, em certo momento, o comandante percebe entre os passageiros uma mãe estreitando ao peito seu filhinho. Sem hesitar, arranca a criança dos braços da mãe, ergue-a e suplica em alta voz: “Senhor, nós pecadores não merecemos ser ouvidos por Vós. Pior do que ser tragados por estas águas revoltas, nosso destino bem poderia ser o eterno fogo do inferno. Mas, Senhor, aqui está um inocente que clama pela vossa misericórdia e intercedei por nós. Clemência, Senhor, por esta inocência!”.
Antes mesmo de devolver à mãe o menino, instantaneamente, as águas tornaram-se serenas.
Façamos o mesmo. A humanidade hoje atravessa uma de suas maiores crises. Neste proceloso Natal, apresentemos o Menino Jesus a Deus Pai e, pela poderosa intercessão de Maria e José, imploremos a verdadeira paz para este mundo tão conturbadamente caótico. Ou seja, peçamos que volte a reinar entre nós a virtude da inocência.
Por Guilherme Maia
Extraído, com adaptações, de:
CLÁ DIAS, João Scognamiglio. O inédito sobre os Evangelhos: comentários aos Evangelhos dominicais. Città del Vaticano-São Paulo: LEV-Instituto Lumen Sapientiæ, 2012, v. 5, p. 119-129.
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