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Resposta do Cardenal Becciu a Andrea Tornielli

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O Cardeal diz ter ficado surpreso com a nota do diretor editorial da mídia vaticana sobre o processo a respeito da ‘Sloane Avenue’.

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Redação (14/11/2024 10:12, Gaudium Press) O Cardeal Angelo Becciu, antigo Secretário de Estado substituto e Prefeito emérito da então Congregação para as Causas dos Santos, respondeu, numa nota publicada no Vatican News, ao Diretor Editorial dos meios de comunicação do Vaticano, Andrea Tornielli, que tinha publicado uma nota, tanto no L’Osservatore Romano como no Vatican news, sobre o processo do Vaticano relativo ao caso da propriedade londrina em Sloane Avenue. Recorde-se que o Cardeal foi considerado culpado em primeira instância.

O direito à defesa

Carta do Cardeal Angelo Becciu – Prefeito emérito do Dicastério para as Causas dos Santos

Durante este processo, até a sentença, apreciei o equilíbrio e a precisão do Vatican News ao informar sobre o procedimento que, apesar de tudo, me envolvia. As audiências foram relatadas em detalhes com um esforço informativo pelo qual só posso felicitar.

Foi justamente por isso que fiquei surpreso ao ler o artigo de Andrea Tornielli, diretor editorial do Dicastério para a Comunicação, intitulado Processo justo e transparência, também publicado no L’Osservatore Romano. Certamente compreendo a necessidade da mídia vaticana de descrever o processo, no qual também fui incluído entre os réus, como “um processo justo” e não quero contestar essa interpretação, embora tenha motivos para isso.

Direito de defesa desvirtuado

A sentença tenta responder às muitas objeções apresentadas pelos meus defensores e pelos dos demais réus; no entanto, bastaria lê-las sem preconceito para perceber que, em alguns casos, o direito de defesa, embora formalmente garantido, seriamente limitado e, no fundo, desvirtuado.

Poder-se-ia pensar que as minhas argumentações poderiam ser consideradas pessoais e ditadas pela emoção, percebidos pela opinião pública como aquelas de um cardeal que outrora tinha grande poder e, pela primeira vez, foi levado a julgamento — cuja primeira instância foi concluída — por decisão do Santo Padre, e que, por essas razões, estaria amargurado e ressentido pelo fato de que suas ações estejam sendo escrutinadas.

Não preciso lembrar da importância do papel do substituto. Ele é o intermediário entre o Papa e a Secretaria de Estado, portanto, possui autonomia de gestão. Sua posição se baseia na confiança e em um relacionamento constante com a autoridade superior, tantas vezes invocada neste processo. É o substituto quem deve fazer a máquina funcionar. É ao substituto que todos no Vaticano recorrem, desde a Gendarmaria até o próprio Tribunal.

Reconheço que, em alguns casos, as ações do substituto podem ser incompreendidas, e sei que não estive isento de erros, como acredito acontecer e acontecerá a todos que, ao longo dos anos, exercem um papel com competências tão vastas, delicadas e heterogêneas. Mas tenho certeza de uma coisa: sempre agi segundo minhas prerrogativas, sem jamais ultrapassar meus poderes e sempre com total lealdade à Santa Sé. Expliquei isso várias vezes durante o processo.

Tornielli destaca que o Tribunal “deu uma ampla possibilidade de intervenção às defesas bem estruturadas dos réus, examinou fatos e documentos sem omitir nada”. Após ler as mais de oitocentas páginas da sentença, poderia objetar a expressão “sem omitir nada”, mas, como mencionei, prefiro abster-me. Chegará o momento de falar sobre as provas a meu favor, totalmente ignoradas na sentença, bem como sobre muitos outros erros que emergem da leitura das motivações.

O papa não foi enganado

Sobre um ponto, no entanto, sinto-me no dever de me pronunciar: a acusação de que eu teria enganado o Papa ao obter, sob o pretexto da libertação de uma religiosa sequestrada no Mali, a autorização dele para usar seiscentos mil euros, quando na verdade o valor era destinado à senhora Cecilia Marogna, com quem teria mantido, inclusive após tomar conhecimento das acusações, “relações totalmente amigáveis, se não de verdadeira intimidade”.

Estou realmente perplexo e rejeito veementemente essa insinuação! Se eu tivesse enganado o Papa, certamente não estaria aqui proclamando minha inocência ao mundo! Essas afirmações são inaceitáveis e, sobretudo, não têm respaldo em qualquer prova!

Sempre servi lealmente ao Santo Padre e essa difícil iniciativa foi conduzida por mim única e exclusivamente para levar adiante a operação humanitária acordada com o Papa, sem qualquer outro propósito.

Passo à segunda parte do artigo, onde se trata “do uso do dinheiro e da necessidade de prestar contas”, como se antes não fosse preciso prestar contas a ninguém e agora sim. Mas essa interpretação não reflete a realidade. Antes, havia um sistema que previa certos tipos de controles; agora há um sistema que prevê outros, diferentes, talvez mais burocráticos, mas não necessariamente melhores. Antes havia uma autonomia de gestão confiada à Secretaria de Estado; agora a Secretaria de Estado não tem mais o poder de administrar o dinheiro, mas isso não significa que não exista mais um centro com autonomia decisória. Essa autonomia foi apenas transferida para outro lugar.

Investimento de 200 milhões, realizado “com a aprovação do superior na época”

Tornielli escreve até mesmo sobre “a triste história do arriscado investimento no fundo de Mincione de 200 milhões, uma quantia enorme para uma operação sem precedentes”. A quantia, concordo, era enorme. Mas foi utilizada com a aprovação do Superior da época e incentivada pelo Escritório responsável pelos investimentos: em primeiro lugar, pelo chefe do Escritório Administrativo, cuja posição, conforme lembrado na própria sentença, foi arquivada.

A afirmação de que não havia precedentes de investimentos semelhantes em grandes propriedades imobiliárias para revenda, é feita sem o menor apoio documental. Também neste caso, bastaria ler os documentos públicos — por exemplo, os balanços da Administração do Patrimônio da Santa Sé — para perceber que investimentos desse tipo existem desde que a Santa Sé adotou uma estrutura financeira como a atual, após os Pactos de Latrão. Tornielli chega a afirmar que é “prejudicial, para uma realidade como a Igreja, adotar categorias e comportamentos próprios das finanças especulativas”, pois “são atitudes que colocam de lado a natureza da Igreja e sua peculiaridade”.

Sinto-me obrigado, com pesar, a não comentar o tom vagamente moralista de Tornielli, que lamenta o fato de que não tenhamos nos comportado como “bons pais de família” e chega a escrever que “diversificar investimentos, considerar o risco, evitar favoritismos e, acima de tudo, evitar transformar o dinheiro que se manipula em um instrumento de poder pessoal são lições a serem tiradas do caso Sloane Avenue”. Não comento porque quero acreditar que Tornielli está escrevendo apenas de maneira geral, sem se referir a mim ou a acusados específicos. E, principalmente, desejo crer que o resultado de um processo penal não dependa das atitudes ou das diferentes sensibilidades em relação aos objetivos de fazer o bem.

Aqui se julgam intenções. Estamos diante de um processo penal, não de um processo destinado a dar lições. Agora, é evidente que um artigo como o de Tornielli considera a mim e a todos os réus condenados de forma definitiva. Em nenhum momento é mencionado que o processo está em primeira instância, que todos os réus têm direito a apelação e que, portanto, somos todos, não só eu, presumivelmente inocentes.

Um presumido inocente — permita-me escrever no que me toca — condenado por peculato, mesmo sem ter obtido qualquer vantagem financeira: nem para si, nem para seus familiares, como também ficou claro na própria sentença. Esta sublinha que minha defesa, mesmo fora do tribunal, sempre reivindicou a ausência de qualquer benefício econômico pessoal.

Um presumido inocente — acrescento — que esteve envolvido no esforço de ajudar a Santa Sé a sair de uma situação de déficit que parece não ter fim, e estou certo de que isso não foi apenas devido ao investimento da Sloane Avenue, o qual era potencialmente um excelente investimento.

Um presumido inocente, enfim, que perdeu tudo, não em nome dos fatos, mas de uma percepção ideológica dos fatos. Gostaria que houvesse a honestidade intelectual de reconhecer que essa presunção nunca existiu. Desde a primeira conversa com o Papa sobre o assunto, fui considerado culpado e apontado nos jornais como corrupto e até insultado. Parece que a vontade política é apenas encerrar a narrativa sobre o processo, procurando não prejudicar a Santa Sé ou o Papa. Pena que, nesse altar, a verdade deva ser sacrificada. Mas a verdade, segundo um ditado atribuído a Santo Agostinho, é como um leão e se defenderá sozinha.

Giovanni Angelo Becciu

Cardeal Diácono de São Lino

Prefeito Emérito da Congregação para as Causas dos Santos

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